Um acordo entre governo e oposição na Comissão Mista que aprovou o orçamento da União para 2011 elevou em R$ 100 milhões de R$ 165 para R$ 265 milhões o montante reservado para os partidos políticos.
Levantamento publicado ontem pelo jornal O Estado de S. Paulo revela que o "reajuste" atende de modo especial ao PT e ao PSDB, cujos déficits relativos às campanhas eleitorais de 2010 correspondem exatamente à diferença entre as quantias que recebiam e as importâncias que passam a receber do fundo partidário.
O PT, que fechou as contas do ano passado com um rombo de R$ 16 milhões, em 2011, receberá do fundo R$ 16,8 milhões a mais. O PSDB, que registrou um déficit de R$ 11,4 milhões, terá direito a um extra no mesmo valor.
Mais claro impossível: os líderes do governo e da oposição usaram suas prerrogativas parlamentares para, com o dinheiro público, urdir uma conta de chegar ao molde das necessidades dos respectivos cofres partidários.
O Poder Executivo viu, mas consentiu. A presidente Dilma Rousseff, "alertada" sobre os riscos de eventual veto à manobra para futuras votações de interesse do governo no Congresso, deixou passar.
Afinal, devem ter argumentado os conselheiros, todos os partidos participaram do acerto e R$ 100 milhões a mais ou a menos não valeriam a confusão.
Nessas horas e diante de atos como esse é que a gente percebe algumas das razões pelas quais a oposição no Brasil é tão branda. Quando compactua com um truque de natureza tão mesquinha com vistas a arrumar suas finanças partidárias, perde autonomia para exercer a delegação que recebeu das urnas para fiscalizar a atuação dos governistas, dentro e fora do Congresso.
Os críticos, muitos, falam em "financiamento público disfarçado". Acertam no substantivo é financiamento público sim, uma vez que o fundo partidário pode ser usado como os partidos bem entenderem, inclusive se entenderem que devem usar o dinheiro para financiar campanhas.
Mas erram no adjetivo não há nada de "disfarçado" nisso. A prevaricação é explícita.
Dissimulação existe é na defesa que os partidos e políticos fazem da instituição do financiamento público oficial, com reserva de verbas específicas no orçamento sob a rubrica "campanha eleitoral", com o argumento de que é a única maneira de regularizar, baratear e moralizar a "área".
Além do fundo partidário, temos hoje a renúncia fiscal proveniente dos horários ditos gratuitos de propaganda no rádio e na televisão, assegurados anualmente haja ou não eleições.
A recente divulgação das prestações de contas da campanha de 2010 feitas à Justiça Eleitoral, revelaram um pouco do imenso descalabro: partidos grandes cooptando legendas menores mediante repasses de recursos, doações fora do limite regular tanto de pessoas físicas como de pessoas jurídicas para os partidos e ocultação dos nomes de beneficiados e benfeitores.
E nisso estamos tratando do lado legal da história. Se tantas irregularidades são cometidas no âmbito do que é permitido por lei, imagine o que não ocorre e continuaria a ocorrer uma vez oficializado o financiamento público no mundo do caixa 2.
Sempre que um episódio desse tipo vem à tona suas excelências aludem ao excesso de hipocrisia no trato da questão e à carência de transparência no sistema.
Nada mais hipócrita. O que acontece é exatamente o contrário: um caso como o do acerto entre governo e oposição para saldar dívidas de partidos mediante aumento do valor dos repasses do fundo partidário, mostra a falta de lisura e a tendência à manipulação do dinheiro público, reduzindo as chances de a sociedade apoiar a instituição do financiamento oficial.
Urgente não é o Congresso aprovar a obrigatoriedade de o Estado financiar as campanhas eleitorais. Urgente é o Congresso perceber a necessidade de fazer antes a sua parte, reconhecendo o quanto são abusivas práticas consideradas normais pelos partidos, mostrando disposição de alterar essas condutas e oferecendo garantias mínimas de integridade no uso do bem público.
PGR defende Gaeco Nacional para evitar ‘Lava Jatos’ do futuro
Com popularidade em queda, Lula busca solução mágica para baixar inflação da comida
O expansionismo de Trump e o olhar internacional para a Amazônia; ouça o podcast
Putin quer se reunir com Trump e diz que guerra não existiria se eleição de 2020 não tivesse sido “roubada”
Deixe sua opinião