“As palavras voam, os escritos permanecem”, registrou, em latim, o vice-presidente Michel Temer (PMDB) na abertura da polêmica carta endereçada à presidente Dilma Rousseff (PT) na segunda-feira (7). De fato, desde a deflagração do processo de impeachment contra Dilma, há uma semana, não faltaram tanto discursos inflamados quanto textos que ficarão para a posteridade – para serem analisados pelos cientistas políticos do futuro. As falas de Dilma, Temer e do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), revelam as estratégias de cada um em meio à crise na política brasileira.
Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários, subsidiários.
Lamento profundamente o que está ocorrendo. Que nosso país possa passar por esse processo, superar esse processo e com isso superar nossas crise política
Veja o que os erros de português revelam sobre a carta de Temer
Acuados, num primeiro momento, eles partiram para o ataque. Foi o que Cunha e Dilma fizeram no dia da deflagração do processo de impeachment. Naquele momento, Cunha e Dilma deixaram de lado o tradicional “falta com a verdade” usado por políticos e optaram pelo verbo mentir. Também acusaram-se mutuamente e falaram em barganha – outra expressão amplamente evitada pelos políticos.
O próximo passo foi a negação – ambos rechaçaram a acusação de que haviam “barganhado” cargos e favores em troca de interesses próprios.
Nunca coagi ou tentei coagir instituições ou pessoas na busca de satisfazer meus interesses. Meu passado e meu presente atestam a minha idoneidade.
Os discursos seguintes diminuíram o tom beligerante. Foi aí que começou a ser construído o conceito de vitimização. A presidência da República alega que um golpe – e não um processo legítimo – está em curso. Cunha, por sua vez, também se diz perseguido.
Foi nesse momento que Temer entrou com força na estratégia que dá corpo à crise política. Alguns pontos da carta de Temer endereçada a Dilma evidenciam a mágoa.
Trechos da carta denotam que Temer se sente injustiçado. “Sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu governo.”
O vice também deixou claro que se sente um figurante. “Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo.” De certa forma, Temer justifica com palavras a decisão de romper com o governo. “Sou presidente do PMDB e a senhora resolveu ignorar-me.”
Ainda não se sabe qual será o tom da próxima fala de Dilma. Depois da carta – e da derrota do governo na terça-feira (8) na comissão que analisará o pedido de impeachment–, a presidente não se pronunciou.
O que os erros de português revelam sobre a carta de Temer
- Katia Brembatti
O tom sempre formal de Michel Temer (PMDB), advogado pós-graduado em Direito Constitucional, não combina muito com o texto um tanto coloquial e ao mesmo tempo pouco preciso que o vice fez chegar às mãos da presidente Dilma Rousseff (PT). Além disso, escorrega na norma culta da Língua Portuguesa.
A professora Ana Paula Mira, responsável pelo blog Toda Letra no site da Gazeta do Povo (www.gazetadopovo.com.br/blogs/toda-letra), analisou a carta de Temer. Alguns trechos, por exemplo, levam à dificuldade de interpretação, como em “À minha natural discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.”
Mais abaixo, dois calos da língua portuguesa: usos errados de “porque” e do acento indicativo da crase. “São erros muito primários, os quais normalmente aparecem na hora do nervosismo ou quando redigimos às pressas. Nem uma nem outra justificativa pode ser aceita para uma correspondência tão importante”, comenta.
No meio político, a carta foi classificada por alguns como um rompimento com o governo, por outros como “fisiologismo puro” e até como desabafo. “É uma carta pessoal de desabafo”, defende o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB).
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