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desenvolvimento econômico

Esqueceram de nós. De novo

Na média, Paraná apresenta bom nível de emprego e renda. Mas muitas microrregiões têm desempenho semelhante ao das localidades mais pobres do Brasil

Elmano Araújo, proprietário de uma empresa de turismo de aventura em Cerro Azul: problemas da estrada que leva ao município afastam turistas e prejudicam os negócios | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Elmano Araújo, proprietário de uma empresa de turismo de aventura em Cerro Azul: problemas da estrada que leva ao município afastam turistas e prejudicam os negócios (Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo)

O Paraná tem um desafio histórico que nenhum governante conseguiu resolver até hoje: a desigualdade é uma das maiores entre os estados com perfil e porte semelhante. O problema costuma ser mascarado pelos bons resultados socioeconômicos obtidos por algumas regiões mais desenvolvidas, como as de Curitiba, Londrina, Maringá e o Oeste. Mas, analisando dados localizados, pode-se afirmar que muitas localidades estão esquecidas há décadas pelo poder público. É o caso da microrregião de Cerro Azul, por exemplo, onde o turismólogo Elmano Araújo tem uma empresa de turismo de aventura.

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Araújo, de 39 anos, começou a atividade no Vale do Ribeira em 2010, depois que outra empresa do ramo, Praia Secreta, reduziu os passeios para a região – a dificuldade de acesso onerava a empreitada. "Quando converso com os clientes que fazem o trajeto em carro próprio, ressalto que é necessário reservar duas horas para percorrer os 90 quilômetros de distância. Eles costumam duvidar de que leva tanto tempo." E levava muito mais até poucos anos atrás. O asfalto da PR-092, até Cerro Azul, só foi feito em 2006. Falta ainda a continuação, para facilitar o acesso do Vale do Ribeira aos Campos Gerais.

Subsistência

O isolamento de Cerro Azul e municípios vizinhos é um exemplo do que ocorre em todo o Paraná, assim como os impactos socioeconômicos decorrentes. O Censo de 2010 do IBGE informa que, na média estadual, 2,54% das pessoas ocupadas produzem apenas para a própria subsistência. Na microrregião de Cerro Azul, esse índice sobe para 13,9%. O de Pitanga (13,2%) e o de São Mateus do Sul (10,1%) não ficam muito longe. Estão entre as 22 piores microrregiões das 254 do Sul e Sudeste.

Quem consegue trabalho nessas localidades economicamente deprimidas dificilmente tem carteira assinada. Na microrregião de Cerro Azul, apenas 24,8% fazem parte do mercado formal. A média paranaense é de 50%. Além disso, Cerro Azul e adjacências apresenta um dos maiores índices de trabalhadores sem instrução de todo o Brasil (65,8%). É o sexto pior desempenho das 558 microrregiões brasileiras.

A falta de instrução do pessoal local é um desafio a mais para a El Mano Aventuras levar turistas para fazer rafting e tirolesa no Vale do Ribeira. "A gente tem dois guias que estão sendo formados, que moram em Cerro Azul, mas o processo de formação é um pouco demorado. A maioria mora em Curitiba e vai até lá prestar serviço", conta Araújo. Ele avalia que o poder público poderia ofertar treinamentos básicos, como o de primeiros socorros. "Isso já seria um incentivo aos empresários."

A falta de programas de qualificação permanente em muitas localidades se reflete na renda da população. Das 39 microrregiões do Paraná, em seis o rendimento médio do pessoal ocupado fica no mesmo patamar que os estados mais pobres do Brasil – Alagoas, Paraíba, Ceará, Piauí e Maranhão.

Potencial

O governo estadual tem obrigação constitucional de proporcionar desenvolvimento de forma equilibrada e descentralizada. Isso ajudaria a aumentar a oferta de emprego e os rendimentos da população. De todo modo, não se trata de fazer "favor" aos municípios esquecidos – a maioria tem um potencial que pode ser explorado. No caso do Vale do Ribeira, que ostenta alguns dos piores índices socioeconômicos do Paraná, há muitos atrativos naturais para serem explorados, conta Araújo. "Em Doutor Ulysses há 14 fontes de água alcalina. A região toda é de formação calcária, e por isso há muitas cavernas, mas quase ninguém as conhece. E tem também a parte histórica da região, da época do Brasil Império", diz o microempresário.

As sugestões de Araújo para o Vale do Ribeira coincide com os caminhos propostos pela economista Augusta Pelinski Raiher, professora da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). "O incentivo da atividade produtiva focado na vocação interna gera emprego e renda. Essa seria a melhor saída. Mas é preciso identificar quais os segmentos a serem incentivados, se há espaço no mercado, estratégia de formação de mão de obra e de identificação dos diferenciais produtivos que se poderia ter", diz.

Falta política de desenvolvimento regional

As desigualdades entre as várias regiões do Paraná são persistentes e têm sido alvo constante de estudos acadêmicos e análises. Mas, apesar do farto material produzido pelos estudiosos, os governantes do Paraná ainda não conseguiram enfrentar de fato esse desafio. Para Jandir Ferreira de Lima, doutor em Desenvolvimento Regional e professor da Unioeste, o grande problema é a falta de uma política de desenvolvimento regional.

"O Paraná não tem uma política efetiva, nem órgãos específicos para isso. O Rio Grande do Sul conta com conselhos regionais de desenvolvimento, assim como o Mato Grosso do Sul. Em Santa Catarina, há a Secretaria de Desenvolvimento Regional, um órgão executor com atuação em todo o estado, que trabalha com lideranças locais e regionais", diz Lima.

Segundo ele, o Paraná conseguiu fazer uma política de desenvolvimento urbano consolidada, que é exemplo para outros locais, mas falhou ao planejar a desconcentração. "A maioria dos incentivos concedidos recentemente proporcionaram a instalação de empresas no eixo próximo a Curitiba, Ponta Grossa e cidades consolidadas como Londrina e Maringá. Não há diferenciação regional, incentivos para áreas mais carentes. Mas esses problemas persistem há muito tempo, não é de agora que o estado falha em interiorizar investimentos", pondera.

Para a doutora em Eco­­nomia Augusta Pelinski Raiher, professora da UEPG, os aspectos sociais precisam ser considerados na dinâmica do desenvolvimento econômico, mas o crescimento é tido como a mola mestre para que se tenha um desenvolvimento subsequente. "Por isso, em regiões que têm um nível de estagnação muito elevado, a geração do emprego e renda é de extrema relevância. Só com renda as pessoas podem consumir, elevar, em parte, seu nível de bem-estar." Segundo ela, alguns municípios podem se beneficiar de incentivos às potencialidades locais. Outros, próximos a grandes aglomerações urbanas, poderiam fomentar atividades complementares às atividades dos municípios vizinhos.

O desenvolvimento econômico do Paraná

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