"O comitê era independente"
Pivô da crise que resultou na exoneração do secretário de Assuntos Metropolitanos Manassés de Oliveira, na última quinta-feira, Alexandre Gardolinski já ocupou vários cargos na prefeitura de Curitiba, desde a administração Cassio Taniguchi, e até a semana passada estava lotado como assessor especial da Secretaria do Trabalho e Emprego.
Candidato é obrigado a declarar toda doação
O candidato que deixar de declarar à Justiça Eleitoral qualquer doação seja em dinheiro ou em forma de bens ou serviços que obteve durante a campanha corre o risco de ter sua prestação de contas considerada irregular. Essa irregularidade, além de tornar o candidato inelegível para as próximas eleições, também pode implicar na cassação do mandato caso seja comprovada captação ilícita de recursos para fins eleitorais, o chamado caixa 2. A sanção também pode ser aplicada quando o pagamento de gastos eleitorais não tiver origem na conta bancária criada especificadamente pelo candidato para a campanha.
Sob suspeita
Nove meses após a eleição, uma gravação revelando os bastidores de um comitê de apoio a Beto Richa levou o prefeito a exonerar na quinta-feira alguns dos envolvidos.
Na última eleição municipal, o PRTB estadual, seguindo orientação da direção nacional do partido, firmou coligação com o PTB que em Curitiba lançou a candidatura do deputado estadual Fábio Camargo para a prefeitura de Curitiba.
A determinação desagradou parte dos candidatos a vereador pelo PRTB muitos deles ligados à administração de Beto Richa, inclusive o então secretário municipal do Trabalho, Manassés Oliveira, que estava licenciado para concorrer a uma vaga de vereador.
Parte dos candidatos a vereador pelo PRTB decidiu, então, abrir mão das candidaturas para apoiar Beto Richa à prefeitura. Além de desistir da eleição, tiveram também que se desfiliar do PRTB.
Os "dissidentes" inauguraram, então, o Comitê Lealdade, de apoio a Beto Richa
O próprio Richa, acompanhado de outras lideranças de sua coligação, como o deputado federal Gustavo Fruet (PSDB) e os estaduais Osmar Bertoldi (DEM) e Neivo Beraldin (PDT), participou da inauguração do comitê. Na ocasião, Richa confere a Alexandre Gardolisnki a responsabilidade de "coordenar essa nossa casa".
Na sede do comitê, que funcionava numa casa no bairro Ahú, em Curitiba, eram feitos os pagamentos em dinheiro vivo aos ex-candidatos do PRTB que decidiram apoiar Richa. Lá, também eram organizados eventos como churrascos de campanha e shows musicais.
Os pagamentos realizados no final de semana anterior à eleição, referentes à segunda parcela do acordo, foram filmados por Gardolinski, alegando "questões de segurança". Os ex-candidatos que aparecem na gravação não sabiam que estavam sendo filmados.
Entre os ex-candidatos que aparecem recebendo dinheiro, estão Manassés de Oliveira secretário do Trabalho na primeira gestão de Beto Richa, à época licenciado por conta da campanha eleitoral e Raul DAraújo Santos, que ocupou a pasta interinamente durante a licença de Manassés. Ambos receberam dinheiro em seus próprios nomes e em nome de terceiros.
Em janeiro, no início do segundo mandato de Beto Richa, nove dissidentes do PRTB foram nomeados para cargos na administração municipal. Entre eles, Gardolinski, Manassés de Oliveira e Raul Santos.
Na quinta-feira passada, Beto Richa demitiu Gardolinski, Manassés e Raul Santos.
As atividades de apoio dos candidatos a vereador do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) à campanha do prefeito Beto Richa na última eleição aparentemente não saiu de graça: custou, ao que tudo indica, dinheiro não declarado à Justiça Eleitoral e cargos na prefeitura.
Durante a campanha, em julho passado, 28 candidatos a vereador do partido, que se coligou com o PTB do então candidato a prefeito Fabio Camargo, abriram mão de suas candidaturas. A maioria deles se uniu para fundar um comitê de apoio ao então candidato à reeleição pelo PSDB o "Comitê Lealdade" .
Uma gravação obtida pela reportagem da Gazeta do Povo mostra que, no entanto, a fidelidade não se deu apenas por convicção política: pelo menos 23 dos dissidentes do PRTB aparecem no vídeo recebendo dinheiro em espécie das mãos de Alexandre Gardolinski, indicado por Richa como coordenador do comitê. Além disso, outras 5 pessoas são citadas na gravação como beneficiárias dos recursos distribuídos.
O vazamento da gravação resultou na demissão de três funcionários da prefeitura na última quinta-feira, incluindo o secretário de Assuntos Metropolitanos, Manassés Oliveira, que aparece na gravação recebendo dinheiro, e o próprio Gardolinski, que ocupava até a última quinta-feira cargo em comissão na Secretaria do Emprego e Trabalho.
Ouvidos pela reportagem, alguns dos envolvidos negaram o recebimento de dinheiro, enquanto outros justificaram que a soma se destinava a custear despesas de campanha do PSDB, já que trabalharam na campanha de Beto.
Além disso, pelo menos oito ex-candidatos dissidentes do PRTB foram nomeados após a eleição para cargos na prefeitura de Curitiba, nas secretarias de Governo, Assuntos Metropolitanos, Trabalho e Emprego, Esporte e Lazer e até no gabinete do prefeito.
Outro integrante do PRTB que aparece no vídeo mas que não foi candidato, Raul DAraújo Santos, ocupava cargo na Secretaria de Assuntos Metropolitanos e também acabou exonerado por Richa na quinta-feira.
Origem desconhecida
No comitê, que funcionava em uma casa no bairro do Ahú, em Curitiba, também eram realizados churrascos, festas e outros eventos eleitorais.
A origem do dinheiro, que pode caracterizar a prática de caixa 2 na campanha, ainda não é conhecida. Mas a reportagem apurou que o Comitê Lealdade não prestou contas ao Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR). Na prestação de contas geral do comitê financeiro da coligação que elegeu o candidato tucano também não constam os nomes, nem os CPFs, das pessoas que aparecem no vídeo recebendo dinheiro ou que são citadas.
O próprio Gardolinski confirma que não houve qualquer prestação de contas. "Era um comitê independente", justifica. Segundo ele, o dinheiro usado para pagar os ex-candidatos veio de "contribuições de amigos". Ele não quis, porém, dizer os nomes dos doadores.
O pagamento a quase todos que abriram mão de concorrer pelo PRTB corresponderia a duas parcelas de R$ 800,00 para cada um, repassados, conforme o vídeo mostra, por Gardolinski mediante assinatura de um recibo.
A gravação mostra os ex-candidatos, um a um, recebendo o dinheiro das mãos de Gardolinski e assinando um recibo referente ao valor pago pelo comitê, além de outras quantias para pagamento de combustível.
Investigação
A Procuradoria Regional Eleitoral do Paraná informou no fim da tarde de sexta-feira, por meio de sua assessoria, que está acompanhando e investigando supostas irregularidades durante a campanha do prefeito Beto Richa na eleição de 2008. A procuradoria não informou, porém, se tem ou não o vídeo.
Demissões
As demissões de Gardolinski, Manassés e Raul Santos ocorreram, coincidentemente, no mesmo dia em que a Gazeta do Povo começou a fazer as entrevistas sobre o caso.
As exonerações foram anuncia-das pela prefeitura no final da tarde. No exato momento em que a assessoria do prefeito fazia o anúncio, às 19 horas, Manassés concedia entrevista à reportagem, na redação da Gazeta. Durante a entrevista, ele foi avisado sobre a exoneração. "Estou desempregado", limitou-se a comentar, nitidamente constrangido (leia mais na página 18).
Manassés ocupava desde o início do ano o cargo de secretário municipal de Assuntos Metropolitanos. Na primeira gestão de Beto, foi o titular da Secretaria do Emprego e Trabalho, onde ficou até a campanha eleitoral do ano passado.
Gardolinski, o autor das gravações, estava lotado na Secretaria Municipal do Trabalho. E Raul DAraújo Santos era o superintendente da Secretaria de Assuntos Metropolitanos. Na época da gravação, ele respondia interinamente pela secretaria de Emprego e Trabalho, no lugar de Manassés.
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