Imagine chegar ao consultório de um médico para reclamar de suas constantes dor de cabeça. De pronto, ele te dá um remédio para tratar problemas renais, e afirma, com convicção, que em poucos dias você estará curado. A resposta da classe política aos clamores populares por menos corrupção e melhores serviços públicos, em junho de 2013, foi mais ou menos assim. A reforma política – que, se analisada sob um crivo mais crítico, está mais para uma reforma eleitoral – pode até ser importante, mas pouco tem a ver esses dois problemas.
Naquela ocasião, a presidente Dilma Rousseff (PT), em rede nacional, destacou a reforma política como uma das medidas de resposta às ruas. O discurso acabou sendo naturalizado pela classe política e, em 2015, o Congresso lançou a reforma para tentar driblar a insatisfação demonstrada pela população ao longo deste ano.
Para o cientista político Alberto Carlos Almeida, do Instituto Análise, essa falsa necessidade de responder aos anseios da população jogou uma pressão desnecessária sobre a comissão. O resultado foi uma proposta que ignorou debates mais aprofundados sobre o tema pela própria Câmara. “O fato de você reformar alguns pontos do sistema eleitoral não leva, necessariamente, à diminuição da corrupção. Estão gerando uma expectativa falsa. Vão fazer uma reforma, e a corrupção não vai diminuir”, afirma.
A principal confusão entre esses dois assuntos é a questão do financiamento eleitoral. A possibilidade de doações eleitorais propicia, também, o uso dessas doações como propinas para agentes públicos – algo que foi evidenciado pela Operação Lava Jato. Entretanto, esse é apenas uma das formas possíveis de corrupção – e a doação está mais para um meio do que para um fim.
Isso não significa que a ideia de reformar o sistema eleitoral seja negativa. Há questões que, de fato, poderiam ser aprimoradas – o próprio financiamento empresarial indiscriminado, por exemplo, pode ser visto como uma forma legal de grandes empresas garantirem posição favorável da classe política em relação a seus interesses privados. Entretanto, não podemos esperar dela algo que ela não pode cumprir. (CM)
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