Pavel Durov, dono do Telegram, foi preso na França. Na Rússia ele estaria bem mais tranquilo, pois o aplicativo é usado por parte das Forças Armadas russas, e ele deve saber muitas coisas. A França proibiu temporariamente o TikTok na Nova Caledônia, porque a rede social estava sendo usada por movimentos independentistas. Recentemente, o ditador Nicolás Maduro entrou em uma disputa com Elon Musk e até o desafiou para uma briga física mesmo. Existe até um episódio de um desenho animado em que Maduro é um super-herói, no qual o Super Bigode manda o magnata para o espaço.
Nos Estados Unidos, Mark Zuckerberg admitiu ter censurado conteúdos sobre a pandemia e o escândalo do laptop de Hunter Biden. Até o perfil do então presidente Donald Trump foi suspenso pelo Twitter, e só voltou depois que a rede social foi comprada por Elon Musk. Tanto nos EUA quanto no Brasil e (ainda mais) na China, viajantes são ou foram questionados no aeroporto, ao entrar no país, sobre publicações de anos atrás nas redes sociais.
No Reino Unido, também estão prendendo gente por publicações em redes sociais, em alguns casos porque de fato incitam a violência física (o que é já normalmente proibido no mundo inteiro), mas, em outros, por opiniões ou informações erradas. Na Rússia, várias pessoas foram presas por se manifestar contra a guerra na Ucrânia, enquanto outros fugiram para o exílio. A última ditadura da Europa, a Belarus, proibiu vários canais de Telegram durante as eleições. Na Turquia, já bloquearam o Instagram e, várias vezes, o Ekşi Sözlük (uma plataforma muito usada no país, similar ao Reddit), porque o povo estava criticando a atuação do Estado depois do terremoto de 2023.
A política já tinha domado a mídia tradicional, mas as redes sociais mudaram tudo, dispersaram a informação e desmascararam muitas mentiras, narrativas e manipulações
Rússia, China, Myanmar, Venezuela, Turcomenistão e Brasil proíbem o Twitter/X – isso para não nem falar de China e Coreia do Norte... O Brasil lidera: por aqui perfis e contas correntes são bloqueados, passaportes são apreendidos e pessoas são presas. Já houve pedido para pegar os dados de todos aqueles que seguiam o então presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais. Agora, o governo quer criar um “WhatsApp brasileiro” para uso de políticos, juízes, militares e burocratas vários, para não passar informações a outros.
Muitos jornalistas e ativistas fogem. A Rússia hospedou Julian Assange e Edward Snowden, fugidos dos EUA, e agora convida críticos da cultura woke que estão sendo reprimidos pelos norte-americanos, que por sua vez hospedam exilados brasileiros. Fugas recíprocas! Do exterior, as pessoas podem falar mais livremente e são usadas como armas contra o outro país.
China e Rússia alegam que WhatsApp, X e Meta passam informações para os EUA. Os EUA alegam que o TikTok repassa dados para a China (e por isso querem banir o aplicativo). As potências se acusam reciprocamente de financiar influenciadores para manipular a opinião pública, e as acusações são sempre as mesmas: extremismo, terrorismo, revelação de segredos de Estado, falta de transparência, segurança nacional, críticas às instituições, fake news, discurso de ódio, ingerência estrangeira na soberania nacional, anonimato, incitação à violência etc.
Parece apenas uma luta contra a direita, já que os perfis cancelados são majoritariamente desse lado. Mas o que ocorre é mais profundo: é uma luta global da velha política contra as redes sociais, uma luta pela informação.
A política já tinha domado a mídia tradicional, mas as redes sociais mudaram tudo, dispersaram a informação e desmascararam muitas mentiras, narrativas e manipulações. A política reagiu, regulamentando as redes sociais com as iniciativas de não neutralidade da rede, de leis como o Stop Online Piracy Act (Sopa) a iniciativas como o Humaniza Redes. É o que o historiador Niall Ferguson chama de “hierarquias contra networks” – mas as hierarquias políticas não agem só no nível doméstico; elas aprenderam a criar networks internacionais. Assange e os “Panama papers” mostram algumas dessas várias articulações da elite global.
Na Primavera Árabe, as redes sociais ajudaram as pessoas a se organizar, a ponto de essa onda ter sido também chamada de “revolução de Facebook”. Mas, depois, Tunísia, Líbia, Síria, Egito etc. conseguiram usar as mesmas big techs para censurar e prender os opositores. É isso que querem. Nossa época, entre outras coisas, será lembrada por essa luta. Quem vencerá? Veremos.
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