• Carregando...
Manifestantes protestam contra a presidente Dilma Rousseff (PT) em Curitiba em março de 2015.
Manifestantes protestam contra a presidente Dilma Rousseff (PT) em Curitiba em março de 2015.| Foto: Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo/Arquivo

Quem está no debate público, principalmente no jornalismo independente e profissional, é todo dia acusado das maiores insanidades por mentes binárias e radicalizadas. É um fenômeno fácil de entender: quem defende político repulsivo precisa fabricar narrativas para convencer o outro que “o outro lado é ainda mais repulsivo”. Qual é o outro lado? Todo mundo que ousa ter a mais leve discordância.

Se você não segue a manada, você não é “isento”, é “torcedor”, segundo os zelotas e hooligans. Essa é uma acusação que aceito com gosto e concordo. Sinceramente, até agradeço. Não existe análise e opinião que não tenha origem em escolhas morais e éticas, em princípios, disposições e valores. Para entender as raízes desse pensamento, recomendo as obras de Gustave Le Bon (Psicologia das Multidões), Michael Oakeshott (A Política da fé e a Política do Ceticismo), Yuval Levin (O Grande Debate), Thomas Sowell (Conflito de Visões) e Jonathan Haidt (A Mente Moralista).

Não vivemos um momento de mera divergência de opinião, mas de posicionamento em relação a marcos civilizatórios. Como disse Reagan, estamos sempre a uma geração de perder a liberdade.

Sou torcedor e confesso. São tempos que é impossível ficar em cima do muro. Não vivemos um momento de mera divergência de opinião, mas de posicionamento em relação a marcos civilizatórios. Como disse Reagan, estamos sempre a uma geração de perder a liberdade. Ou lembrando Claude Lévy-Strauss, estamos sempre correndo o risco de pular da barbárie à decadência sem conhecermos a civilização.

Um exemplo dramático: a pregação antivax, que lamentavelmente inclui até anjos caídos do jornalismo, fez com que os índices de vacinação contra todas as doenças fossem comprometidos. Hoje há um risco real da volta da terrível poliomielite, uma doença muito debilitante que tem cura, basta vacinar. O SUS aplica mais de 300 milhões de doses de vacina por ano, mas esse número tem caído constantemente e a pajelança antivacina é diretamente responsável por isso.

Como ser neutro ou isento quando há quem use suas plataformas e canais de comunicação para atacar as vacinas e até a própria ciência? Ou quando crianças deixam de ser imunizadas pela irresponsabilidade militante de pais que sequer podem alegar ignorância, já que temos um dos programas de vacinação de maior sucesso no mundo? Que tipo de gente defende tratamentos comprovadamente ineficazes apenas para ganhar cliques ou vender produtos para mentes frágeis? O que dizer de quem se calou frente às revelações da CPI da Covid? Como torcedor, minha torcida é cadeia para essa gente.

É possível ficar em cima do muro quando verbas de educação, uma das tragédias brasileiras, foram condicionadas ao pagamento de propinas, algumas em barras de ouro? Como não se indignar com o uso descarado do Ministério da Educação para os fins mais escusos por gente com livre trânsito com o poder em Brasília? Já esqueceram o que o próprio ex-ministro Milton Ribeiro confessou? O torcedor aqui está torcendo, evidentemente, para que as investigações sejam independentes, livres e que possam chegar aos culpados.

Como ser cúmplice do orçamento secreto, um escândalo de fazer o mensalão parecer brincadeira de criança? A terceirização do orçamento da união para o centrão, que de fato governa o país, levou a compra de kits de robótica para escolas sem energia elétrica ou a contratação de tratamentos odontológicos que superam o número de habitantes do município beneficiado? O torcedor aqui espera que esses crimes sejam desvendados e punidos com todo rigor da lei.

Eu não tenho torcida em relação ao resultado das urnas, assim como não torci para traficantes ou milicianos no Tropa de Elite 2. A esperança que nos resta é lutar para recuperar a institucionalidade, o respeito ao Estado Democrático de Direito, o fim do assédio à democracia e o arrefecimento do clima de violência política que já vitimou brasileiros que apenas exerciam seu direito de opinião.

Em momentos como esse, não escolher um lado já é uma escolha. Faça a sua, avaliando as consequências e desdobramentos. Informe-se diretamente nas fontes primárias e não apenas pelo zap ou nas mídias com agendas político-partidárias claras. Fazendo isso, você não está sendo isento, está torcendo por um país melhor para você, sua família e sua comunidade. Não se isente da responsabilidade e faça valer seus direitos como cidadão e brasileiro. É a minha torcida para você.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]