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A política brasileira, incluindo as “extravagâncias” do Judiciário, como qualificou o ministro aposentado do STF Marco Aurélio Mello, já ultrapassou os limites da Praça dos Três Poderes e ganha o mundo. Além do futebol e carnaval, temos as “extravagâncias”. O editorial da edição de domingo de The Wall Street Journal confirma essa expansão para o mundo. É o diário de maior reputação nos Estados Unidos, sendo conhecido como The Journal. Ou seja, é “o jornal”, publicado pelos produtores do índice Dow Jones, e tem a idade da nossa república. Pois o editorial entrou no varejo do Supremo, com o caso Filipe Martins, instando Donald Trump a investigar com transparência a falsificação da entrada de Martins nos Estados Unidos.
Na Europa, será lançado em agosto um documentário com cerca de duas horas sobre o Supremo brasileiro, produzido pelo jornalista português que ficou detido quando veio participar de manifestação na Paulista. Volta e meia o Washington Post dá opinião criticando a suprema corte brasileira. E Trump dá ao Brasil um tratamento especialmente duro, deixando claro que é por causa da “caça às bruxas”, uma perseguição à direita brasileira, e por falta de transparência na apuração de eleições. Faltam poucos dias para vigorar a tarifa de 50% sobre as importações americanas do Brasil e, além disso, paira sobre algumas cabeças como espada de Dâmocles a Lei Magnitsky – nome que todo jornalista já pronuncia com familiaridade.
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Por aqui, vamos ajudando a inflar esse noticiário estrangeiro. O presidente, todos os dias, desafia, debocha, provoca o presidente dos Estados Unidos. Parece desejar ter uma desculpa para todos os males provocados pela administração Lula, desde a falta de picanha até os juros, a dívida gigantesca e os déficits. No Supremo, o ministro Alexandre de Moraes recrudesce a cada dia. Até nos detalhes, como não admitir militar fardado em audiência. Se a intenção de Hélio Lopes, ao acampar na Praça dos Três Poderes, era jogar uma isca para ver se Moraes a abocanharia, funcionou: o ministro a mordeu e arrastou a Constituição. Não deu a mínima para os pétreos direitos de reunião, manifestação, de ir e vir, e mandou o governador tirar de lá o deputado, ainda que tivesse de tirá-lo da cama, como aconteceu. Não foi inédito; esses direitos já haviam sido infringidos na pandemia – e por prefeitos. A retirada do deputado Hélio Lopes das proximidades da Câmara Federal passou a fazer parte do inquérito das “fake news”, de 2019. Profético, o ministro Marco Aurélio o chamou de “inquérito do fim do mundo”.
As inconstitucionalidades são conhecidas há meia dúzia de anos; conhecidas da mídia, da OAB, dos juristas, dos professores – mas são escondidas nas consciências. Vergonha nossa estarem nos principais jornais norte-americanos e europeus, mas não nos nossos, com a veemência com que devem ser tratadas infrações graves a direitos fundamentais. Vergonha nossa estarem na boca do secretário de Estado e do presidente norte-americano, mas não na boca do presidente da OAB nacional ou do presidente de um Senado omisso. Alguns senadores foram pedir socorro a Trump. Alegamos que Trump ataca nossa soberania, mas não mostramos soberania suficiente para defender nossa própria Constituição, a maior das leis, a que limita o poder do Estado para que a nação seja livre para pensar, debater, criticar, fiscalizar, eleger. Agora temos uma extravagância histórica: um chefe de Estado estrangeiro defendendo nossa Constituição sem ter jurado defendê-la – como jurou Lula.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos




