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Escrevo essa coluna em meio a uma necessária pausa criativa; período para reflexões.
Importante para que consiga seguir a risca meu propósito (fortalecido depois que me pós-graduei em Filosofia) de não criar "por nada e do nada". Mas, sim, criar produtos que sejam artifícios de reflexão e que contribuam com a sociedade, indo além do "atender uma função de uso".
Para tanto, encontrei meu paraíso na Itália. Mas não em meu atelier na linda e caótica Milão; mas sim em um singelo "paese" chamado Giuliano di Roma (área nos campos romanos). Por aqui, tudo passa mais devagar. As crianças brincam pelas ruas, os velhinhos jogam dominó na praça e todos se encontram para uma conversa desinteressada (mas não desinteressante) pelas ruas dessa cidadela medieval. Por aqui é como se houvesse um pacto de boicote ao celular e à hiperconexão do mundo digital.
O que já é comumente especial, torna- se ainda mais nesse período, chamado FERRAGOSTO (ou Festa de Augusto), que data período romano, no qual comemorava-se a colheita dando-se descanso inclusive aos escravos. Tal espírito de festa, regada a eventos tradicionais, permanece o mesmo por aqui.
Mas o motivo dessa coluna é trazer luz à reflexão sobre o mundo paradoxal no qual vivemos. De uma lado, a hiperconexão nos aproxima dos distantes e nos distancia de nós mesmos (e de nossas raízes). O (necessário) senso de comunidade fortalece os comerciantes locais. O pão? Sai todas as manhãs “del fornaio" Lello. A mussarela de búfala vem semanalmente trazida pelas mãos de Giannina. As verduras, é só pedir ao Alécio, que as produz na "campagna" dessa cidadezinha medieval.
Tudo isso não ocorre por um grande distanciamento de grandes polos e centros de distribuição (50 minutos de Roma e 1h30 de Nápoles), mas sim pela valorização (e orgulho) da produção local. Um ensinamento sobre a importância econômica da valorização da produção em comunidade. O nobre leitor já se perguntou por onde anda aquele vendedor de pamonha ou quitanda que lhe atendia? Por certo deram lugar às grandes redes de supermercados globais que invadem bairro a bairro, cidade a cidade.
Tenho minha vida profissional construída entre Brasil e Itália, percurso pavimentado no decorrer de minha trajetória de 23 anos. Dessa forma, além do espaço no design, conquistei grandes amigos e, sobretudo, aprendi a entender a cultura italiana. Brasil e Itália têm características parecidas por sua disparidade e pluralidade cultural.
Conhecer bem a cultura italiana é entender que a beleza da Itália vai muito além dos cartões-postais. Por aqui, fujo dos destinos "trend" de alta temporada, onde encontrarei as mesmíssimas características, seja em São Paulo, Paris ou Nova York: pessoas apressadas, acotovelando-se em busca do clique perfeito para imediato "post" nas mídias sociais. Não bastassem os registros "fast foods", são ainda, em geral, registros de uma cafona ostentação.
No que tange o mundo criativo, vejo a corrida para deglutir as tendências. Especialistas de plantão correm em “feitas” ao redor do mundo e se apressam na sintetização das mesmas para colher o valor de visionários da cassação de tendências. Porém, acredito que a mais relevante das tendências é o encontro da essência.
Aqueles que a conquistam fatalmente estão à frente na expressão das mesmas. A tendência é um senso comum, a essência uma singularidade.Um grande pintor não surge olhando para fora; mas sim para dentro de si mesmo.
Por aqui entendo a sábia frase de Da Vinci "a simplicidade é o mais alto grau de sofisticação". Mas caso o nobre leitor não procure a beleza do essencial, fatalmente confundirá simplicidade com simploriedade.
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