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Diogo Schelp

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Internacional

Desistência de Biden pode encerrar ciclo de derrotismo entre os democratas

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Biden desistiu da disputa e anunciou a vice Kamala Harris como sua sucessora na disputa pela presidência dos EUA em novembro (Foto: Robyn Beck/AFP)

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Há de se reconhecer que exige coragem e espírito democrático desistir de disputar uma reeleição, mesmo com todas as previsões de derrota. A bola estava com o presidente americano Joe Biden, cabia a ele decidir pela desistência ou não. Ainda que parecesse inevitável que ele saísse da corrida eleitoral, a verdade é que ele podia enfrentar os caciques do partido e os doadores e seguir em frente, afundando qualquer chance de vencer Trump. Ele tinha o direito de buscar a reeleição.

Mas é aí que se vê como uma democracia pode se diferenciar de uma ditadura. Em uma democracia, é menos espantoso que o homem que detém o poder aceite abrir mão dele. E não é fácil abrir mão de poder. Biden diz ter feito isso em prol do partido, em prol de um projeto político, em prol do que ele considera melhor pro país. Em uma ditadura, tudo leva ao caminho contrário, ou seja, à concentração de poder e à perpetuação no cargo a qualquer custo.

Com a desistência acontecendo agora, os democratas ganham uma chance de cortar a onda que Trump estava surfando depois de sofrer um atentado

Se Biden tivesse insistido e resistido à pressão pela desistência, seria derrotado facilmente por Trump. Agora, continua sendo provável que Trump vença, mas o desafio será maior.

O timing da desistência, apesar de muitos reclamarem da demora de Biden em tomar essa decisão, pode acabar sendo bom para os democratas. Há exatamente uma semana começava a Convenção Republicana, em que Trump apareceu como mártir e herói depois de ter sobrevivido a uma tentativa de assassinato. Fortalecido e unificando o Partido Republicano em torno dele, Trump, que já era favorito para vencer antes mesmo do atentado, só perderia de Biden por um milagre.

Uma semana depois, Biden cria um novo fato político com a sua desistência. Antes, o derrotismo havia dominado o Partido Democrata. Se nem a cúpula democrata acreditava na vitória, que dirá a base. Agora, a situação é diferente. Existe o estímulo que nasce da novidade. Qualquer candidato que venha a ser escolhido será melhor que Biden, ainda que Trump siga sendo o favorito.

Na última semana, na política americana, só se falava de Trump. Agora, pelos próximos dias, os holofotes se voltarão para o processo de escolha da substituta ou substituto de Biden. Ou seja, com a desistência acontecendo agora, os democratas ganham uma chance de cortar a onda que Trump estava surfando depois de sofrer um atentado. Ele terá de dividir atenção com uma campanha democrata renovada.

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Se Biden se mantivesse na disputa, os delegados escolhidos nas primárias democratas teriam de confirmá-lo na convenção do partido, que começa no dia 19 de agosto. Agora, estão em tese livres para escolher qualquer outro candidato. Mas é provável que, em vez de uma convenção aberta — em que se faria uma espécie de mini primária, com todos os pré-candidatos se apresentando para disputar os votos dos delegados —, os democratas realizem na primeira semana de agosto uma votação online, que já estava sendo planejada antes por que alguns estados precisam da definição mais cedo para incluir o nome do candidato na cédula de votação. Isso acontece porque, nos Estados Unidos, cada estado tem o seu processo de votação específico.

Se houver uma definição online, a Convenção Democrata se tornará apenas um evento de confirmação em prol do candidato escolhido previamente, como foi a Convenção Republicana na semana passada. Biden indicou sua vice Kamala Harris como sucessora, e ela já recebeu apoio de democratas importantes. Bill e Hillary Clinton, por exemplo, aderiram ao seu nome. O ex-presidente Barack Obama ainda não.

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Segundo pesquisas feitas antes da desistência de Biden, Kamala Harris tinha um desempenho um pouco melhor que ele contra Trump, mas não muito. Ela estava dois pontos percentuais atrás de Trump, portanto dentro da margem de erro. Isso em uma eventual votação geral, quando o que realmente importa é o desempenho nos estados pêndulos, que a depender da eleição oscilam para o lado dos democratas ou dos republicanos. Nesses estados, Kamala Harris tem uma oportunidade ligeiramente maior de equilibrar a disputa com Trump do que tinha Biden.

Ainda assim, as chances de Harris nesses estados são menores do que há quatro anos, quando Biden venceu Trump. Naquela eleição, Biden aparecia nas pesquisas à frente de Trump em estados como a Pensilvânia. Agora Trump está à frente, tanto faz se com Biden ou com Harris.

Já era assim antes daquele debate em que Biden teve um péssimo desempenho, que levou à pressão interna para que ele desistisse. Ou seja, Trump já é favorito há vários meses, e Kamala Harris, que enfrenta suas próprias resistências junto ao eleitorado, terá uma tarefa muito difícil pela frente para reverter esse quadro, caso seja confirmada como candidata após a desistência de Biden.

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Harris tem 59 anos e é filha de imigrantes da Jamaica e da Índia, ambos engajados na luta dos direitos civis nos Estados Unidos. O aspecto racial é considerado por muitos estrategistas democratas como uma aposta para conquistar votos junto ao eleitorado negro e como contraponto ao discurso anti-imigração de Trump. Ela vem de uma carreira no Direito, tendo sido promotora na Califórnia antes de ser eleita senadora. Também é considerada mais progressista do que Biden, o que muitos analistas acreditam ser um problema para uma candidata que precisa atrair votos de indecisos mais ao centro e à centro-direita que não gostam de Trump. Por outro lado, Trump terá em Harris uma debatedora mais afiada que Biden.

Enfim, a campanha que começa agora é bem diferente da campanha que os americanos estavam vendo há duas semanas. Os democratas têm a chance de deixar o derrotismo para trás, mas as questões que davam favoritismo a Trump antes mesmo do fatídico debate em que massacrou Biden continuam existindo.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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