Desde o início do ano, a palavra "relança" tornou-se onipresente nas manchetes que anunciam iniciativas do governo Lula. Prestes a completar 100 dias desde o seu começo, o terceiro mandato do petista é marcado pela reciclagem de programas descontinuados ou já existentes. Às vezes a simples troca de nome ou algumas mudanças nos detalhes do funcionamento de políticas públicas já conhecidas, algumas bem-sucedidas, outras nem tanto, bastam para apresentá-las com pompa em eventos com a presença do presidente, discursos grandiosos e imagens elaboradas nos mínimos detalhes por marqueteiros, como a da foto que ilustra este artigo. Quanto à aprovação de medidas essenciais para tirar a economia da inércia, como as novas regras para controlar o gasto público, não se viu nada até agora.
Já havia ficado claro na campanha eleitoral que a única coisa que Lula tinha a oferecer era a possibilidade de desbancar Jair Bolsonaro do Palácio do Planalto. O programa com as propostas de governo do PT era um deserto de ideias novas — ou mesmo de ideias consagradas que comprovadamente dão certo, o que às vezes é até melhor.
Tudo o que se viu até o momento foi a pressão sobre o Banco Central para reduzir a taxa básica de juros, como se isso fosse uma bala mágica para todos os problemas.
Da política externa à economia, tudo o que se apresentou naquele momento era a repetição do que se viu em gestões anteriores do PT, como a diplomacia "ativa e altiva" de Celso Amorim, ou palavras vagas, que passavam a impressão de que o candidato estava escondendo o jogo ou simplesmente não tinha nada na manga. É provável que esta última opção explique melhor as propostas no campo econômico. O governo diz que aposta na reforma tributária para fazer a economia deslanchar e em um arcabouço fiscal que deixe margem para "investir" no social. Mas tudo o que se viu até o momento foi a pressão sobre o Banco Central para reduzir a taxa básica de juros, como se isso fosse uma bala mágica para todos os problemas. Enquanto isso, Lula percorre o Brasil em seus relançamentos.
Na semana passada, a manchete era: "Lula relança Programa de Aquisição de Alimentos". O programa foi criado em 2003, no primeiro mandato de Lula, na esteira do chamado "Fome Zero", uma promessa de campanha para acabar com a desnutrição no país. Consiste em comprar alimentos de pequenos produtores e repassá-los a famílias em "situação de vulnerabilidade social". Ao longo dos anos, foi marcado por fraudes e desvios, como apontou reportagem da Gazeta do Povo.
"Lula relança Bolsa Família" e "Lula relança Minha Casa, Minha Vida", porém, foram com certeza os relançamentos mais vistosos do governo até agora.
O novo PAA tem a marca dos novos corolários progressistas. Determina a participação mínima de 50% de mulheres na execução do programa e priorizará também "negros, indígenas, quilombolas e assentados da reforma agrária". Esse nem é o problema, mas, sim, se dessa vez vai funcionar e atingirá os objetivos definidos, ou se vai ser mais uma vez apenas um lance de marketing político-eleitoral e uma forma de direcionar recursos para grupos sociais amigos.
"Lula relança Pronasci" foi outra manchete que se viu recentemente. O Pronasci é o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania, criado no segundo mandato de Lula para que o governo federal pudesse auxiliar estados e municípios em ações de segurança pública. O programa perdeu força já no governo Dilma Rousseff. Em seu formato reciclado, terá como foco o enfrentamento à violência contra as mulheres.
Na realidade, são programas que nunca deixaram de existir, apenas tiveram o nome e as regras de funcionamento modificados no governo Bolsonaro.
"Lula relança Mais Médicos." Essa todo mundo viu. O polêmico programa criado no governo Dilma que serviu para transferir recursos bilionários para a ditadura de Cuba, que em troca enviou milhares de profissionais de saúde para trabalhar no Brasil em lugares remotos, onde médicos brasileiros não se interessam em se estabelecer. Um problema real com uma solução mambembe, que levou à violação de direitos humanos de trabalhadores estrangeiros. O novo Mais Médicos, garante o governo, terá incentivos adicionais para atrair profissionais brasileiros para as vagas a serem preenchidas.
Na semana passada, depois de visitar um complexo naval e de visitar as obras de reconstrução do Museu Nacional no Rio de Janeiro, Lula "relançou" diversas medidas de fomento à cultura, reunidas em um único pacote com novas regras de funcionamento, abolindo alguns dos procedimentos adotados no governo Bolsonaro.
"Lula relança Bolsa Família" e "Lula relança Minha Casa, Minha Vida", porém, foram com certeza os relançamentos mais vistosos do governo até agora. Na realidade, são programas que nunca deixaram de existir, apenas tiveram o nome (Auxílio Brasil e Casa Verde e Amarela) e as regras de funcionamento modificados no governo Bolsonaro (outro que se preocupava mais com o marketing eleitoral do que com a efetividade dos projetos).
Também tivemos "Lula relança Água para Todos", um programa de distribuição de água e saneamento básicos em regiões de seca, e logo veremos "Lula relança PAC repaginado e renomeado". PAC, Programa de Aceleração do Crescimento, criado no segundo mandato de Lula, foi o programa-vitrine do governo Dilma e consistiu principalmente em grandes obras de infraestrutura, a exemplo da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. A sigla ficou contaminada pelo fracasso econômico da gestão Dilma, razão pela qual o novo pacote de infraestrutura deverá ganhar um novo nome. Lula recomendou ao ministro Paulo Pimenta, da Comunicação Social, criatividade no batismo do programa reciclado.
Até agora, o governo Lula está sendo menos do mesmo.
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