É cedo, muito cedo, para falar na sucessão de Arthur Lira na presidência da Câmara dos Deputados, alertou o próprio Lira em entrevista recente. "Essa sucessão não está em aberto. Quem botar a unha de fora, esquece. Vai arrumar um problema comigo", completou o todo-poderoso deputado federal pelo PP de Alagoas. É natural que ele queira deixar o assunto de fora da pauta, fiando-se na lógica de que, na política, articulações por um sucessor enfraquecem aquele que ainda está no cargo, reduzindo a sua influência e protagonismo. O caráter temporário do seu poder torna-se evidente.
O fato é que o poder do presidente da Câmara é, inegavelmente, temporário. Ainda tem muita água para rolar até fevereiro de 2025, quando Lira terá de deixar o cargo, pois não pode buscar nova reeleição. E até lá ele ainda tem muito a desfrutar do inédito poder que ele conseguiu acumular no cargo.
Lira certamente está fazendo os seus cálculos pessoais do que vai ser dele quando o seu mandato na presidência da Câmara acabar.
Mas, Lira querendo ou não, a futura sucessão é assunto nos bastidores do Congresso. A antecipação da discussão em mais de um ano talvez seja efeito da própria dimensão extraordinária do poder atual da presidência da Câmara, conquistado no governo de Jair Bolsonaro, quando Lira praticamente assumiu o comando de um bom naco do orçamento do governo por meio das emendas de relator. Se a especulação em torno de nomes para a Presidência da República já começa assim que o vencedor da eleição passada toma posse, não é de se surpreender que o cargo de presidente da Câmara — que nos últimos tempos adquiriu ares de primeiro-ministro, sem o ônus de responder pelas falhas do Poder Executivo como ocorre em um sistema parlamentarista de fato — receba a mesma atenção precoce de candidatos à sucessão.
Por tudo isso, ainda que não possa admitir em público, Lira certamente está fazendo os seus cálculos pessoais do que vai ser dele quando o seu mandato na presidência da Câmara acabar. Afinal, antes dele, os dois ocupantes do cargo que também exerceram grande poder e influência tiveram destinos melancólicos.
Se conseguir indicar seu sucessor, Lira vai garantir que ele lhe dê o protagonismo dos bastidores.
Rodrigo Maia, que presidiu a casa entre 2016 e 2019, encerrou sua gestão em guerra com aliados e não conseguiu eleger um sucessor. Seu erro foi justamente não preparar com antecedência um nome de sua confiança para substituí-lo, enquanto nutria a esperança de disputar uma segunda reeleição seguida. Arthur Lira, o vencedor, vinha articulando sua candidatura durante anos.
Depois de seis mandatos como deputado federal, Maia não disputou nova eleição e preferiu ocupar um posto de secretário no governo de João Doria no estado de São Paulo e coordenar a malfadada tentativa do governador de concorrer à `Presidência da República pelo PSDB. Atualmente, Maia atua no setor privado como presidente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras. Está bem empregado, mas deixou a política.
A melhor chance de Lira conseguir manter influência a partir de fevereiro de 2025 é atrelar o destino do governo Lula ao seu.
Antes dele, Eduardo Cunha, que ocupou a presidência da Câmara em 2015 e 2016, viu-se forçado a renunciar em meio ao processo de impeachment de Dilma Rousseff, que ele ajudou a desencadear. Foi cassado por mentir à CPI da Petrobras e em seguida preso na Operação Lava Jato. No ano passado, tentou voltar à Câmara dos Deputados, mas não conseguiu se eleger.
Por ora, Lira parece ter escapado de ter um destino semelhante ao de Cunha. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou as provas envolvendo o seu nome no escândalo dos kits de robótica superfaturados. Em junho, o STF já havia rejeitado uma denúncia contra Lira por corrupção passiva no caso do assessor pego no aeroporto tentando viajar com grande quantidade de dinheiro em espécie.
Sua melhor chance de conseguir manter influência a partir de fevereiro de 2025 é atrelar o destino do governo Lula ao seu. Ou seja, construir uma situação que torne muito arriscado para Lula apoiar outro candidato para a presidência da Câmara que não seja aquele que Lira venha a indicar. Os nomes possíveis, por enquanto, são Elmar Nascimento (União-BA) e Marcos Pereira (Republicanos-SP), ambos da confiança de Lira. Se conseguir indicar seu sucessor, Lira vai garantir que ele lhe dê o protagonismo dos bastidores e o poder de comandar a negociação de matérias de interesse do governo em nome do maior bloco de partidos na Câmara.
Para o governo Lula, o ideal era ter na presidência da Câmara alguém 100% alinhado, sem condicionantes de cargos e liberação de emendas. Mas isso, se a conjuntura em 2025 não for muito diferente da que vemos hoje, é para lá de improvável. O que pode levar o governo a colocar "a unha de fora", para repetir as palavras de Lira, seria uma estrondosa aprovação popular alavancada por uma economia em franca decolagem. Ainda assim, seria uma jogada arriscada.
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