Ouça este conteúdo
Mais um ano que começa e, seguindo a tradição de ocasiões anteriores, levantamos alguns aspectos e temas para ficarmos de olho no ano que começa aqui no nosso espaço de política internacional. Comecemos com um balanço dos principais pleitos e eleições nacionais de 2024. Depois de vermos algumas eleições asiáticas e latino-americanas que nos aguardam, daremos uma olhada nas eleições europeias de 2024.
A primeira eleição europeia de 2024 é uma das mais importantes, especialmente para os brasileiros, embora não apenas por isso. No dia dez de março, os portugueses vão às urnas eleger um novo parlamento. A eleição estava originalmente prevista para 2026, mas, em novembro de 2023, o primeiro-ministro António Costa, do Partido Socialista, renunciou. A renúncia foi oficializada apenas em dezembro, para a votação do orçamento.
O terceiro governo de António Costa foi estranhamente marcado por instabilidade. O “estranhamente” se deve pelo fato de ser um governo de um partido com maioria no Parlamento, sem a necessidade de complexas coalizões ou cálculos políticos. Dois escândalos foram os principais causadores dessa instabilidade. Um envolveu a TAP Air Portugal e outro a concessão de contratos para os setores de lítio e hidrogênio.
Em novembro, durante as investigações dos contratos de lítio e hidrogênio, as autoridades portuguesas realizaram buscas na residência oficial do Primeiro-Ministro e em outros ministérios, resultando na prisão do chefe de gabinete de António Costa e consequente renúncia do chefe de governo, que foi citado em uma gravação. No total, desde março de 2022, foram treze renúncias no governo português.
Trata-se da primeira vez que um governo formado por um partido com maioria não completa seu mandato na história democrática do país. Costa foi sucedido, no último dia sete de janeiro, por Pedro Nuno Santos na liderança do PS. Além de quinze anos como deputado, o economista foi Ministro das Infraestruturas e da Habitação nos últimos quatro anos, e é da ala ainda mais à esquerda do partido de esquerda.
Pesquisas em Portugal
O PS lidera as pesquisas, com cerca de 30% das intenções de voto, bastante abaixo do seu desempenho acachapante no pleito de 2022, quando obteve a maioria. Em segundo lugar, com cerca de 26%, está a Aliança Democrática, a coalizão conservadora, liderada pelo Partido Social Democrata. Apesar do nome, trata-se do maior partido conservador do país, do atual presidente Marcelo Rebelo de Sousa e liderado por Luís Montenegro.
Consolidando sua posição atual de terceira força do Parlamento está o Chega, partido de direita nacionalista e anti-imigração, com alguns setores apologéticos da ditadura fascista do Estado Novo de António Salazar. Liderado por André Ventura, que já foi tema de um perfil aqui em nosso espaço, quando das eleições presidenciais de 2021, o partido gira em torno de 15% da intenção de voto nas pesquisas.
Outros 5% das intenções de voto estão com a Iniciativa Liberal, de centro-direita, e outros 14% das intenções de voto se dividem entre os vários partidos de esquerda radical e os dois partidos verdes portugueses. Principalmente, o Bloco de Esquerda, de esquerda radical, que fez parte da famosa “Geringonça”, a frente de vários partidos de esquerda que governou Portugal entre 2015 e 2019.
Caso confirme o desempenho das pesquisas, o Chega passará de 7% para 15% da preferência do eleitorado, dobrando seus votos. É complicado fazer alguma projeção do número de cadeiras, já que isso dependeria da distribuição dos votos pelos distritos. O PS, por exemplo, conseguiu a citada maioria de assentos tendo 41,4% dos votos, ou seja, não teve a maioria dos votos.
Além de confirmar sua posição como terceira força, o Chega pode até mesmo se tornar o fator decisivo, o “kingmaker”, de um eventual governo de direita, caso o PSD aceite negociar uma formação de governo com a legenda anti-migração.O crescimento do Chega também pode ser preocupante para os brasileiros, que hoje são cerca de 400 mil em Portugal, 40% da população estrangeira, sem incluir os brasileiros com cidadania europeia.
Bálcãs
No dia 8 de maio ocorrerão eleições na Macedônia do Norte, república da ex-Iugoslávia que se tornou membro da OTAN em 2020, o mais recente membro antes da invasão russa da Ucrânia. Nos últimos oito anos, o país direcionou suas relações para o chamado Ocidente, normalizando suas relações com a vizinha Grécia como parte da ascensão para a citada OTAN e também para a União Europeia.
Essa guinada foi conduzida pela União Social-Democrata da Macedônia, partido de centro-esquerda e que busca uma representação multiétnica da sociedade de seu país, incluindo as minorias como os albaneses. Provavelmente, essa guinada pró-Ocidente chegará ao fim em 2024, já que as pesquisas indicam o retorno ao poder da Organização Revolucionária Interna da Macedônia.
Conhecido pela sigla local VMRO, trata-se de um partido nacionalista e chauvinista, contra a representação das minorias albanesas e incluindo até elementos irredentistas em seu discurso. Na década de 1990 e início dos anos 2000, os nacionalistas eram os defensores da aproximação com o Ocidente, como uma maneira de garantir a defesa do pequeno país contra uma eventual agressão vizinha, como da Iugoslávia, posteriormente Sérvia.
A normalização das relações com a Grécia conduzida pelos social-democratas, entretanto, fez a situação se inverter. Hoje, o VMRO é um partido pró-Rússia e anti-adesão à União Europeia. Outro elemento importante nessa situação é a Bulgária. Os búlgaros ocuparam o território da Macedônia do Norte durante a Segunda Guerra Mundial e existem tanto rancores quanto laços históricos entre as duas comunidades.
A ascensão de um governo pró-Ocidente na Bulgária e os protestos norte-macedônios de 2022 deram força ao VMRO e seus setores pró-Rússia. Caso o partido confirme sua vitória, Putin conquistará outro aliado dentro da principal aliança militar dos EUA. Outra eleição balcânica ocorrerá até 22 de novembro, na Croácia, onde os conservadores pró-UE da União Democrática Croata continuarão no poder, com imensa aprovação popular.
Outros pleitos
Em 15 de março teremos eleições presidenciais na Rússia, quando Putin conquistará seu quinto mandato, o terceiro seguido e o primeiro na contagem da atual constituição reformada. O pleito será abordado em mais detalhes em março, embora a eleição em si provavelmente não seja tão digna de análises complexas. Foi um extenso e aprofundado perfil de Putin, de 2018, que marcou a primeira colaboração do colunista aqui na Gazeta.
Já em junho será a vez dos belgas elegerem seu parlamento e, hoje, ao que tudo indica, o país continuará com um Legislativo pulverizado entre diversas legendas e sem um governo claro e viável. No segundo semestre, teremos eleições na Áustria, onde a extrema-direita do Partido da Liberdade da Áustria é favorita para vencer as eleições, mas onde não conseguirá formar sozinha um governo.
Por volta de outubro, três países ex-soviéticos realizarão eleições, a Geórgia, a Lituânia e Moldova. Outra eleição potencialmente no fim de 2024 ocorrerá na Romênia, embora ela possa ser realizada também no início de 2025. Mesma situação do Reino Unido, onde o mandato da atual Câmara dos Comuns acaba no dia 28 de janeiro. Se a eleição fosse hoje, os trabalhistas ganhariam de lavada, mas isso será tema para outra coluna.
VEJA TAMBÉM:
Conteúdo editado por: Bruna Frascolla Bloise