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Por motivos justos e óbvios, o conflito entre Israel e o Hamas está monopolizando o noticiário internacional. Mesmo temas antes muito presentes, como a guerra na Ucrânia, foram deixados de lado nessa última semana, incluindo aqui em nosso espaço. Isso não quer dizer que o mundo parou. Pelo contrário, ocorreram diversos pleitos pelo globo, com referendos e novos chefes de governo.
Comecemos pela Austrália. No último sábado, dia 14, os cidadãos do país votaram em um referendo que criaria a "Voz dos Aborígenes e dos nativos das Ilhas do Estreito de Torres", um órgão consultivo para representar os povos originários do país em temas políticos. O referendo havia sido aprovado em maio e o novo órgão não teria poderes, nem executivos e nem legislativos.
Houve muita discussão legal sobre o impacto da emenda constitucional proposta pelo referendo e, com comparecimento de 79% dos eleitores, 60,7% rejeitaram a proposta. Além da derrota nacional, nenhum estado aprovou a medida, apenas o distrito federal. Pelas leis australianas, ao menos metade dos estados da federação também precisam aprovar o tema em um referendo.
Conservadores na Nova Zelândia
Também no sábado, a Nova Zelândia, que realizou eleições gerais. O premiê e candidato trabalhista foi Chris Hipkins, que sucedeu Jacinda Ardern depois de a ex-primeira-ministra anunciar sua aposentadoria da vida política. Ela governou de outubro de 2017 a janeiro de 2023, ou seja, durante toda a pandemia. Em teoria, Hipkins teria cerca de dez meses para se tornar o rosto do governo e disputar o pleito.
Hipkins foi um governante social-democrata burocrático. Realizou uma profunda reforma dos gastos sociais do país, incluindo mais dinheiro para combater a inflação pós-pandemia e verbas para recuperação de desastres naturais. Mesmo as medidas tendo um impacto positivo no curto prazo, ele pouco conseguiu, ou soube, capitalizar politicamente em cima disso e disputou as eleições como azarão.
Os conservadores do Partido Nacional ficaram com 38,9% dos votos e levaram 50 dos 122 assentos do parlamento, os 120 habituais mais dois pelo cálculo de proporção. Christopher Luxon, líder do partido, provavelmente será o próximo primeiro-ministro, mas necessitará de uma coalizão. Os derrotados Trabalhistas ficaram com 34 assentos, 31 a menos do que possuíam antes, e apenas 26,9% dos votos.
O comparecimento eleitoral foi menor do que no pleito anterior e o parlamento é concluído com os verdes, com catorze assentos, liberais, com onze cadeiras, nacionalistas com oito e o partido maori com quatro. Ainda há uma cadeira por decidir, no distrito de Port Waikato, devido ao falecimento do candidato liberal Neil Christensen durante a campanha. Um novo pleito no distrito será realizado em novembro.
Muito provavelmente os conservadores farão uma coalizão eleitoral com os liberais do partido ACT e com os nacionalistas do Nova Zelândia Primeiro, que foi fundado como uma facção do Partido Nacional, inclusive. Ambos os partidos já foram aliados tanto dos trabalhistas quanto dos conservadores. Da Nova Zelândia, cruzamos o Oceano Pacífico rumo ao nosso quase vizinho Equador.
Liberal no Equador
O presidente mais novo do mundo será o equatoriano Daniel Noboa, de 35 anos, que governará seu país de novembro de 2023 a maio de 2025, pelo menos. Liberal de direita da Ação Democrática Liberal, que teve 23,4% dos votos no primeiro turno, ele venceu o segundo turno disputado no último domingo, dia 15. Noboa ficou com 51,8% dos votos, contra 48,1% dos votos de Luisa González.
Gonzalez foi a candidata do Revolução Cidadã de Rafael Correa, de esquerda e esquerda radical, e teve 33,6% dos votos no primeiro turno. O motivo de Noboa ter apenas cerca de 18 meses de mandato é pelo fato de que ele apenas concluirá o mandato de Guillermo Lasso, presidente que acionou a "morte cruzada" meses atrás, dissolvendo tanto o Executivo quanto o Legislativo e convocando eleições gerais.
Esse será um dos desafios de Noboa, que precisará, em curto tempo, equilibrar entre fazer um governo viável e preparar o terreno para uma eventual tentativa de reeleição. O principal desafio, não importasse quem ganhasse, seria a questão de segurança pública. O Equador está marcado pelo conflito entre cartéis de drogas, que já deixaram centenas de pessoas mortas, incluindo o candidato presidencial Fernando Villavicencio.
O Equador não é grande produtor da folha de coca e nem é grande consumidor de narcóticos. O que está no centro da morte dessa centenas de equatorianos é o uso estrangeiro de cocaína. Com isso, o porto de Guayaquil, no dolarizado Equador, torna-se um centro importantíssimo de distribuição da coca e da cocaína produzida em países vizinhos. Do Equador, a droga segue para EUA, Reino Unido e Albânia.
Outro desafio de Noboa é que ele não terá muito apoio na Assembleia Nacional. Seu partido foi apenas o terceiro mais votado no Legislativo, e o Revolução Cidadã ficou disparado em primeiro, com quase metade dos assentos.
“Geringonça” na Polônia
Finalmente, domingo também foi dia de eleições gerais na Polônia. Os poloneses elegeram os integrantes das duas casas do Parlamento e também votaram em um referendo de seis perguntas.
Ainda não temos os números finais das eleições polonesas, muito menos do referendo, o que justifica um olhar mais aprofundado em um futuro próximo. O que está claro é que, na principal eleição, para a Sejm, a câmara baixa do Parlamento, o atual governo polonês sairá menor do que entrou. No caso, a coalizão governista Direita Unida, com o conservador Lei e Justiça e seus aliados de direita.
O Lei e Justiça ficou com cerca de 35,5% dos votos, abaixo dos 43,6% obtidos no pleito anterior, em 2019. Em segundo lugar ficou a centro-direita liberal da Coalizão Cívica, liderada pelo ex-premiê e ex-presidente do Conselho Europeu Donald Tusk, com cerca de 30% das intenções de voto. Em terceiro lugar está a Terceira Via, um partido conservador pró-União Europeia, com 14% dos votos.
Em quarto lugar os social-democratas do Nova Esquerda, com 8,5% dos votos e, finalmente, a Confederação, de extrema-direita, com 7% dos votos. Novamente, ainda não temos os números finais e a contagem de assentos, mas Donald Tusk já declarou vitória. Como já comentamos algumas vezes aqui em nosso espaço, no parlamentarismo, por vezes ocorre o “ganhou, mas não levou”.
O Direita Unida, mesmo ficando em primeiro, não conseguiria assentos suficientes para uma maioria, especialmente pelo fato de que os três partidos seguintes rejeitam fazer uma coalizão com o governo conservador polonês. Consideram que a legenda liderada por Jarosław Kaczynski ameaça a democracia polonesa, o Estado laico, a estabilidade política e os laços com a União Europeia.
Além disso, inflação e episódios de corrupção, como o escândalo de uma enorme estrutura para vendas de vistos poloneses, afetou o desempenho eleitoral do Lei e Justiça. Já os três partidos opositores somados, embora não sejam ideologicamente coesos, possuem duas plataformas em comum: a rejeição ao populismo do Lei e Justiça e a postura pró-União Europeia. Somados, teriam algo como 248 cadeiras, suficiente para uma maioria.
O que provavelmente teremos na Polônia é um impasse que pode durar meses. O Lei e Justiça, como vencedor das eleições, receberá o direito de tentar formar uma coalizão primeiro, mas dificilmente conseguirá. Enquanto isso, a oposição terá de costurar uma “geringonça”, pegando o termo político português, para criar um governo viável. Barbas de molho pois a resolução não virá facilmente.
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