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Filipe Figueiredo

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Explicações para os principais acontecimentos da política internacional

Demagogia

Milei e os brios agitados pelas Malvinas na Argentina

Milei agora quer as Malvinas. (Foto: EFE/EPA/ABIR SULTAN)

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Em um dos debates das eleições presidenciais argentinas em 2023, Javier Milei elogiou a ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, o que causou repercussão negativa. Afinal, mesmo ele tendo professado sua admiração pelas políticas econômicas de Thatcher, na Argentina ela é sinônimo de humilhação na Guerra das Malvinas, em 1982. Especialmente, a morte de centenas de marinheiros do cruzador General Belgrado, cujo afundamento foi autorizado diretamente por seu governo. A postura de Milei em relação ao arquipélago mudou e, agora, ecoa o que há de mais tradicional na Argentina.

Ao fim da campanha presidencial, Milei afirmou que “Tivemos uma guerra que perdemos e temos de fazer todos os esforços para recuperar as ilhas pelos canais diplomáticos. Óbvio que eu vou defender as Malvinas”. Após vencer as eleições, em novembro de 2023, Milei foi parabenizado pelo governo britânico com o “lembrete” nada sutil de que "Da nossa parte, é obviamente uma questão que está resolvida há algum tempo. Não há planos para rever isso. A posição das Ilhas Malvinas está resolvida há algum tempo e não vai mudar". As rusgas não pararam aí.

No dia três de janeiro, data que marca a reivindicação britânica de soberania em 1833, o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Argentina afirmou ter “os legítimos direitos do sobre as ilhas Malvinas” e pediu que o Reino Unido “retome negociações bilaterais”. O governo britânico, novamente, reafirmou sua soberania. Um dos principais argumentos de Londres é centrado no fato de que, em 2013, foi realizado um referendo no território. Da população de cerca de dois mil habitantes, 99,8% dos eleitores votaram pela continuidade como um dos catorze Territórios Ultramarinos Britânicos.

Visita de Cameron

Nessa última semana tivemos, então, o terceiro episódio envolvendo o governo Milei na Argentina e o governo britânico de Rishi Sunak. Aproveitando a visita ao Rio de Janeiro, para a reunião de ministros do exterior do G20, o secretário de Estado para Relações Exteriores e assuntos da Commonwealth, o ex-premiê, David Cameron, visitou as Ilhas Malvinas e o Paraguai, tornando-se o primeiro secretário de Estado britânico a visitar Assunção. Claro que a terminologia utilizada por Cameron e por seu governo é de ilhas Falklands, nome que homenageia o então Visconde de Falkland, uma cidade escocesa.

Ainda sobre a terminologia, é importante pontuar que o Estado brasileiro sempre reconheceu o pleito argentino e que o termo correto, portanto, é Malvinas. Durante a guerra de 1982, inclusive, o Brasil, então governado por João Figueiredo, forneceu apoio político e militar aos argentinos. Retornando para 2024, segundo o comunicado britânico, “Cameron vai se reunir com líderes do governo das Ilhas Falklands e aprenderá sobre a gama de comunidades que fazem parte da família britânica quando visitar Stanley e outros locais deste território ultramarino”.

Cameron também visitou campos de batalha e memoriais aos militares britânicos mortos na guerra. A visita não passou despercebida pelas autoridades argentinas, que entenderam bem o recado: afirmar a soberania britânica no território, independente de a esquerda ou a direita governar em Buenos Aires. A reação argentina começou por um chiste da ministra de Relações Exteriores, Diana Mondino, em uma rede social. “Valorizamos o gesto do Chanceler do Reino Unido, Cameron, de incluir a Argentina na sua visita à região. Teremos o maior prazer em recebê-lo, numa próxima ocasião, também em Buenos Aires.”

Ou seja, Mondino deixa claro que, para ela, Malvinas são Argentina. Depois, o governador da província de Terra do Fogo, Antártida e Ilhas do Atlântico Sul, Gustavo Melella, opositor de Milei, disse ver a visita como uma provocação e declarou Cameron persona non grata na província mais austral da Argentina. A questão continuou no encontro presencial entre Mondino e Cameron, no Rio de Janeiro, quando a argentina expressou "mal-estar por suas declarações e sua visita às Ilhas Malvinas", além de reafirmar a reivindicação de soberania pela Argentina.

Populismo

A declaração que causou maior mal-estar foi quando Cameron manifestou desejar que os habitantes do arquipélago queiram seguir "para sempre" sob administração do Reino Unido. Em três meses, já tivemos uma série de desencontros entre Argentina e Reino Unido pelas Malvinas, algo que muitas pessoas não previam ou não imaginavam em um governo Milei. Muito provavelmente, inclusive, Milei não acredita, como indivíduo, em nada disso. Sabe, como a maioria das pessoas, que as Malvinas são, hoje, uma causa perdida. As chances argentinas de uma solução negociada morreram em 1982.

Ao estampar jornais com a guarnição britânica tomada prisioneira e causar o derramamento de sangue pelo território, a última ditadura militar argentina transformou a posse de um gélido e remoto arquipélago em questão de honra. Nada indica que, num futuro próximo, a Argentina voltará a ter a capacidade militar para uma empreitada dessas, depois de literalmente jogar fora o PIB de um ano inteiro em 1982. Desde então, militarmente falando, a Argentina está neutralizada, consequência das ações covardes de sua junta militar, que enviou garotos conscritos para o frio e a morte.

Economicamente falando, as Malvinas são atraentes por sua vasta zona econômica exclusiva, onde existem reservas de gás natural e, potencialmente, de petróleo, embora de difícil exploração. O que o governo Milei está fazendo é o bom e velho populismo. Não um de natureza econômica, mas de discurso nacional. Com a guerra e a consequente humilhação, as Malvinas também são uma questão de honra na Argentina e movimentam os brios da esquerda e da direita. Milei não pode simplesmente abandonar essa bandeira. Como presidente, tem que fingir que também é sua. Afinal, fingir não custa nada.

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Conteúdo editado por: Bruna Frascolla Bloise

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