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Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern

Banalização

Chamar a todos de “extremista de direita” está gerando assassinatos

Rotular todo mundo de “extrema‑direita” banaliza acusações, desumaniza adversários e cria terreno para justificar violência. (Foto: Chris Boese/Unsplash)

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Suponhamos que exista a máquina do tempo de H. G. Wells. Se pudéssemos voltar até o começo do século XX e você desse de cara com um jovem austríaco chamado Adolf em um beco deserto, e porventura você tivesse uma arma carregada consigo — você puxaria o gatilho?

Provavelmente a resposta da maioria da humanidade seria um sonoro “sim”, sem necessidade de muita justificativa. Mesmo as pessoas mais inocentes, mais avessas à violência, com mais horror a sangue, menos crentes na tese de um bode expiatório que possa ser sacrificado para trazer alguma paz social — todas essas pessoas não teriam dúvida e puxariam o gatilho. Eu puxaria.

Mas o que acontece quando você normaliza esta questão, tratando metade da humanidade como se fosse o jovem Adolf em um beco deserto? Você acha que causaríamos uma situação análoga à que o próprio Adolf criou?

Basta abrir um jornal, assistir a cinco minutos de Rede Globo (nem precisa ser um noticiário), frequentar uma aula do ensino médio (talvez do fundamental), estudar para o vestibular, ouvir uma conversa no ônibus — e você verá que praticamente metade das pessoas está sendo tratada como um risco tão grande quanto o Adolf.

Rótulo mortal

Lula disse que “erramos ao permitir o avanço da extrema direita”. O que ele deveria ter feito? O mesmo que fizeram com Charlie Kirk? O Instituto Humanitas Unisinos considera que “extrema-direita” (sic) é quem “ameaça a governança mundial” (sic). Além do hífen agramatical, parece que a única visão que impede um totalitarismo único mundial é a tal da extrema direita, que acaba se tornando deveras interessante.

Putin, o chefão da KGB, neto do cozinheiro de Lenin e Stalin (a quem adora brindar perante convidados internacionais), foi alvo de uma curiosa manchete do infobae: “Vladimir Putin insiste em sua visão ultraconservadora de gênero: ‘Uma mulher é uma mulher, um homem é um homem’” (sic). Assim ficamos sabendo que precisamos ser “ultraconservadores” para reconhecer um pingolim como um pingolim. O difícil é aguentar Putin entre os comensais. O curioso é que ser contra a guerra da Ucrânia também é uma política de extrema direita, aprendemos com os jornalistas.

E quando Filipe Martins ajeitou a lapela do terno com cara de sono (tinha acabado de voltar de Israel!), foi chamado de “supremacista” por isso? Felipe Neto chegou a postar que é contra violência contra animais, o que inclui seres humanos (sic), mas que não considera “supremacistas” seres humanos — isto em meio a um sem número de tweets sobre Filipe Martins. Depois apagou. Felipe Neto tinha um vídeo ensinando crianças a fazer exatamente o mesmo gesto. Já Filipe Martins recebeu inúmeras ameaças de morte após a campanha de Felipe Neto.

Ser contra o Hamas é ser de extrema direita. Querer que juízes do STF obedeçam à lei, em vez de mandarem nos outros Poderes, fazerem política e imporem seus desejos particulares à sociedade, é ser extremista de direita (e golpista)

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Segundo Sâmia Bomfim, ser contra a manipulação dos impostos pelo governo (“diminuindo” o imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil, e aumentando o imposto sobre consumo para compensar) é uma política de “centrão e extrema direita”, mostrando que a direita simplesmente inexiste hoje sem o rótulo de “extrema”, colocado apenas para pegar mal.

Assim, “extrema direita” vira um mero rótulo vazio (e comparável ao… centrão). Como se saber a verdade inconveniente sobre Erika Hilton tornasse alguém extremista, fanático, irracional, maníaco, doente, violento.

É quase impossível postar qualquer coisa normal nas redes sociais sem ser chamado de extremista ou fascista. E aí voltamos ao dilema inicial: se alguém pudesse dar cabo de um Hitler e evitar um genocídio, não o faria? E o que acontece com a sociedade se toda pessoa é chamada de “fascista” por acreditar que imposto não gera riqueza, que o mensalão foi um crime de compra de votos para abolir o Poder Legislativo, que o Estado não deve interferir em assuntos privados, que o MEC não deve praticar doutrinação? E, ironia das ironias, todas essas coisas são crenças fascistas — o MEC, inclusive, tendo sido criado pelo nosso ditador fascista, inspirado no próprio Mussolini.

Na dúvida, devemos sempre consultar os donos do Brasil, os agentes não eleitos do Estado que determinam quais devam ser nossas crenças. No caso, temos uma resposta nas mãos de Flávio Dino.

O ministro que já censurou livro, que já determinou até o destino de verbas legislativas, que já puniu inocentes simplesmente chamando-os de “golpistas”, que mandou a Polícia Federal investigar quem o chamou de comunista em um voo e que já fez um youtuber ter de se exilar por chamá-lo de “gordola”, este mesmo Flávio Dino também acha que chamar de “nazista” uma pessoa inocente não tem problema nenhum. Caiu em suas mãos um processo de Gustavo Gayer (PL‑GO) contra José Neto (PP‑GO), que havia chamado Gayer de “nazista”. Flávio Dino declarou:

“Eu considero que as palavras ‘nazista’, ‘fascista’ não possuem o caráter de ofensa pessoal ao ponto de caracterizar calúnia, injúria e difamação. É uma corrente política estruturada na sociedade, no planeta, basta examinar as eleições da Alemanha em curso em que há um partido que é formado basicamente por herdeiros dessa corrente política [...] Nesses 18 anos eu fui acusado de praticamente tudo que possa existir de negativo num debate político, mas sempre diferenciei o que era o debate político”, disse o ministro durante o julgamento.

“Nazista, fascista, de extrema‑direita, extremista, é da ditadura, apoio a ditadura militar, não apoiou, defende a democracia, defende o comunismo, é do muro de Berlim… Essas coisas todas que são ditas há décadas fazem parte, infelizmente, de um certo debate político ‘normal’”, completou Dino.

Ou seja: aí não é fake news. Aí não é o equivalente a “gordola” (e era fake news?). Aí “faz parte do debate”. Aí é liberdade de expressão.

E o debate, hoje, é tratar pessoas normais como nazistas. Eu atiraria em um nazista durante a Segunda Guerra se soubesse que isso pouparia muitas vidas inocentes. Foi o que pensou Tyler Robinson, quando subiu em um telhado e disparou contra Charlie Kirk, um pai de família que dizia que, sem o debate, haveria violência, e preferia ir sozinho contra vários esquerdistas em universidades para vencê‑los pelas ideias.

Como vencer ideias como a de que homens são homens? De que temos mais ligações existenciais com nossa família do que com o Estado? (E isto não é ser radicalmente antifascista?) De que liberdade de expressão é importante? De que argumentos são melhores do que controle ideológico por um poder central?

Só se vence essas ideias com balas. E quando você, na sua fantasia, acredita que está matando não um pai de família dono de bons argumentos, mas um nazista perigoso, você dá um tiro em Charlie Kirk. Você dá uma facada em Jair Bolsonaro. Você dispara quatro tiros em Miguel Uribe. Você tenta matar Donald Trump, que escapou apenas por ter virado a cabeça (isto contando apenas o principal de outros dois atentados). Você faz uma emboscada contra Fernando Villavicencio.

Afinal, são “extremistas”. São como Hitler. O erro é NÃO matá‑los. Faz parte do debate. Afinal, você aprendeu direitinho na Rede Globo.

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