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Originalmente, os Jogos Olímpicos foram realizados em Olímpia, na Grécia, entre cerca de 776 a.C. e 393 d.C., quando foram proibidos pelo imperador cristão Teodósio I, por suas conexões com o paganismo. Na época dos Jogos, os arautos anunciavam uma “trégua sagrada”, que proibia a guerra durante o período da competição e visava proteger os espectadores e atletas durante sua vinda, estadia e regresso – trégua que algumas vezes foi esquecida, como durante a Guerra do Peloponeso. Na era moderna, a primeira edição dos Jogos Olímpicos ocorreu em 1896, em Atenas, na Grécia. E, desde então, eles têm ocorrido a cada quatro anos, com atletas de centenas de países se reunindo em uma cidade-sede para disputarem muitas modalidades esportivas. Apenas três vezes os Jogos foram cancelados – por causa da Primeira e da Segunda Guerra Mundial, em 1916, 1940 e 1944. E ocorreram boicotes de alguns países às edições de 1956, 1976, 1980 e 1984.
Uma tocante homenagem em Tóquio
Neste ano, os Jogos Olímpicos estão ocorrendo em Tóquio, no Japão. A cerimônia de abertura foi sóbria, elegante, digna e emotiva, começando na sexta-feira, 23 de julho às 8 horas da manhã em ponto, no horário brasileiro. Pela primeira vez na história, a abertura não contou com a presença de torcedores, em razão da pandemia do coronavírus, a tragédia que adiou a competição em um ano. O tema da abertura intentou transmitir uma mensagem de unidade e esperança a um mundo fragmentado e amedrontado diante da pandemia do vírus surgido na China e que está longe de ser debelada. O ápice da cerimônia foi estrelado pela premiada tenista Naomi Osaka – que criou o lema “tudo bem não estar bem”, após desistir da disputa de Roland Garros em junho de 2021 para cuidar da sua saúde mental –, que acendeu a pira olímpica em uma simbólica representação do Monte Fuji. Mas outro momento emocionante foi a homenagem feita aos seis treinadores e cinco atletas olímpicos israelenses cruelmente assassinados por terroristas palestinos, durante os Jogos Olímpicos de Munique, em 1972.
O ataque terrorista em Munique
Em 5 de setembro de 1972, membros da equipe olímpica de Israel foram feitos reféns na Vila Olímpica dos atletas em Munique, na Alemanha, por terroristas palestinos treinados na Líbia e no Líbano. Eles pertenciam à Organização Setembro Negro, ligado ao Fatah. A segurança do local era precária, e os terroristas estavam armados de pistolas, fuzis e granadas. Eles exigiram a libertação de centenas de presos palestinos em Israel, além da soltura dos líderes do grupo terrorista alemão de extrema-esquerda Fração do Exército Vermelho, conhecido como Grupo Baader-Meinhof. Horas depois, 11 israelenses, cinco terroristas árabes – que receberam funeral de “mártires” na Líbia – e um policial alemão estavam mortos depois de um impasse e de uma tentativa de resgate mal planejada da polícia alemã, na base aérea de Fürstenfeldbruck.
Os atletas e treinadores assassinados pelo grupo terrorista muçulmano eram David Berger (atleta, levantamento de peso), Ze’ev Friedman (atleta, levantamento de peso), Yossef Gutfreund (árbitro, luta olímpica), Eliezer Halfin (atleta, luta olímpica), Yossef Romano (atleta, levantamento de peso), Amitzur Shapira (treinador, atletismo), Kehat Shorr (treinador, tiro), Mark Slavin (atleta, luta olímpica), Andre Spitzer (treinador, esgrima), Yakov Springer (árbitro, levantamento de peso) e Moshe Weinberg (treinador, luta olímpica).
Em Tóquio, pela primeira vez os israelenses mortos em Munique foram lembrados em uma cerimônia de abertura olímpica
Três terroristas do Setembro Negro sobreviveram ao confronto com a polícia alemã e foram mantidos em uma prisão em Munique, esperando julgamento. Mas, em 29 de outubro de 1972, o vôo 615 da Lufthansa foi sequestrado por simpatizantes do infame grupo e os sequestradores ameaçaram explodir a aeronave se os terroristas de Munique não fossem libertados. Os três foram imediatamente libertados pela Alemanha Ocidental, e receberam uma recepção de heróis quando chegaram à Líbia de Muammar Kadafi.
O rei Hussein, da Jordânia, o único líder de um país árabe a denunciar publicamente o ataque criminoso dos palestinos em Munique, chamou-o de “crime selvagem contra a civilização (...) perpetrado por mentes doentias”. Aliás, o Setembro Negro teve sua origem nos conflitos ocorridos em 1970 e 1971 entre guerrilheiros da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) e o exército da Jordânia, quando os palestinos tentaram um golpe de Estado para derrubar o rei Hussein. Como resultado, milhares de palestinos foram mortos; os sobreviventes foram expulsos e migraram para o sul do Líbano.
A resposta de Israel ao terror
Tem sido dito que o governo da Alemanha Ocidental, liderado pelo primeiro-ministro Willy Brandt, recusou-se a permitir a intervenção, na Vila Olímpica de Munique, de uma equipe de operações especiais das Forças de Defesa de Israel (IDF), conforme sugerido por Golda Meir, a premiê de Israel. A Alemanha Ocidental, àquela altura, por força de sua Constituição, não podia empregar unidades militares no próprio país. Logo, a responsabilidade de lidar com o ataque do Setembro Negro caiu sobre forças policiais alemãs, que não tinham treinamento e equipamento apropriado para resolver um sequestro envolvendo reféns. O resultado foi o massacre dos atletas israelenses em Munique.
A resposta de Israel foi dupla. A Operação Ira de Deus (Mivtza Za’am Ha’El) foi uma ação contraterrorista implementada pela Mossad, que criou equipes especiais que caçaram e eliminaram na Europa dezenas de militantes do Setembro Negro e da OLP, que de alguma forma estavam relacionados ao massacre de Munique. Também foi lançada a Operação Primavera da Juventude (Mivtsa Aviv Ne’urim), ocorrida em 9 e 10 de abril de 1973, quando equipes das forças especiais da Sayeret Matkal, paraquedistas da Sayeret Tzanhanim e comandos navais da Shayetet 13, das IDF, atacaram vários alvos da OLP em Beirute e Sidon, no Líbano. Dois militares israelenses e dezenas de combatentes da OLP foram mortos durante o combate.
A luta pelo reconhecimento
As famílias das 11 vítimas israelenses do ataque terrorista em Munique pediam havia tempos que o Comitê Olímpico Internacional (COI) realizasse um momento de silêncio durante as cerimônias de abertura dos Jogos, mas até a sexta-feira passada este pedido vinha sendo recusado. Em 2016, no Rio, o COI inaugurou um Lugar de Luto em uma parte da Vila Olímpica para lembrar os israelenses mortos em 1972. Na ocasião, duas das viúvas dos atletas estiveram presentes. Mas, neste ano, em um momento de “homenagem aos que partiram”, os atletas e treinadores israelenses foram lembrados com um minuto reverente de silêncio, às 8h20. Esta foi a primeira vez que isso aconteceu durante uma cerimônia olímpica de abertura. Na oportunidade, as pessoas presentes ao Estádio Nacional de Tóquio foram convidadas a se levantar para homenagear as vítimas – incluindo os falecidos na pandemia do coronavírus, os mortos em terremotos e tsunamis, e as vítimas do acidente nuclear de Fukushima, catástrofes que abalaram o Japão nos últimos anos – com um momento de silêncio. Entre as pessoas que participaram da homenagem no estádio estavam o imperador do Japão, Naruhito, e o presidente do COI, Thomas Bach.
O antissemitismo na atualidade
Mesmo depois de 6 milhões de judeus assassinados no Holocausto nacional-socialista na Segunda Guerra Mundial, o antissemitismo – muitas vezes disfarçado de antissionismo – ressurgiu nas últimas décadas com virulência na Europa e nos Estados Unidos, espalhando-se também por meio do terror e violência. Na atualidade, jornais europeus publicam artigos apoiando o boicote econômico e cultural contra Israel, e há uma crescente enxurrada de caricaturas antissemitas que agora acompanham artigos anti-israelenses na imprensa europeia. Muitas charges retratam os judeus como “parasitas”, exatamente como a imprensa alemã antes da Segunda Guerra Mundial e os países muçulmanos na atualidade retratam os judeus.
Mesmo entre cristãos, ideias antissemitas ainda estão presentes. A acusação de deicídio, que atribuía aos judeus a culpa coletiva pela morte do Senhor Jesus, ainda hoje é repetida por vários clérigos e leigos. E a teoria da substituição ainda hoje é muito aceita por esse mesmo grupo. Esta é a noção de que a nova aliança firmada com a Igreja seria uma substituição da aliança mosaica firmada com Israel. Com isso, a igreja seria, assim, o novo Israel, substituindo o Israel étnico como a menina dos olhos de Deus (Dt 32,17; Sl 17,8; Zc 2,8).
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Sobre a indigna acusação de deicídio, Bento XVI afirma, em sua obra Jesus de Nazaré, que os responsáveis pela crucificação do Senhor Jesus não foram o povo judeu como um todo, mas “a aristocracia do templo” em Jerusalém e as “massas”, isto é, “os partidários de Barrabás”. Sobre a popular ideia de que a Igreja seria o novo Israel, Gerald McDermott destaca, em seu livro A importância de Israel, que “no Novo Testamento não encontramos o termo ‘novo Israel’ nem seu conteúdo – isto é, a ideia de que poderia haver um Israel que não tenha o Israel dos judeus como base”. Muitos cristãos, escandalosamente, desconsideram que a fé cristã surgiu num contexto judaico e os escritores do Novo Testamento eram judeus – a única exceção talvez seja Lucas –, assim como o próprio Senhor Jesus, o único Messias, o descendente do rei Davi e eterno Filho de Deus, o ressurreto restaurador e salvador de todos os pecadores, judeus e gentios, que têm fé nele. É desconcertante pensar que cristãos ainda nutram essas ideias ainda hoje, especialmente à luz do terrível Holocausto judeu.
Antissemitismo nos Jogos Olímpicos
Vários Estados-membros da ONU não reconhecem formalmente o Estado de Israel. Entre eles estão Arábia Saudita, Afeganistão, Argélia, Catar, Coreia do Norte, Cuba, Indonésia, Iêmen, Irã, Iraque, Kuwait, Líbano, Líbia, Malásia, Omã, Paquistão, Síria, Somália, Tunísia e Venezuela. Alguns desses países nunca aceitaram o reconhecimento do Estado de Israel, fundado em 14 de maio de 1948. Na verdade, o que alguns desses países almejam é a total destruição de Israel e o extermínio dos judeus.
Mal os jogos começaram em Tóquio, o judoca argelino Fethi Nourine desistiu de participar da competição para evitar um possível confronto com o judoca israelense Tohar Butbul na segunda rodada. Nourine afirmou: “Não vamos fazer com que a bandeira de Israel seja erguida e não vamos sujar as mãos lutando com um israelense”. O técnico de Nourine, Amar Ben Yekhlef, confirmou a decisão, tomada em conjunto com o judoca argelino: “Não tivemos sorte no sorteio. Trabalhamos duro para nos classificar aos Jogos, mas a causa palestina é maior que tudo isso. Nós recusamos a normalização das relações com Israel”.
Essa é a segunda vez que o argelino se recusa a lutar contra o israelense. A primeira vez ocorreu no Campeonato Mundial de Judô, em 2019. No sábado, a Federação Internacional de Judô (IJF) anunciou a suspensão de Nourine e do seu treinador: “A IJF tem uma política rígida de não discriminação, promovendo a solidariedade como um princípio fundamental, reforçado pelos valores do judô. A retirada de Nourine foi em total oposição à filosofia da Federação Internacional de Judô”.
Nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, o judoca egípcio Islam el Shehaby abandonou a competição poucas horas depois de se negar a cumprimentar um rival israelense, Or Sasson, que o derrotou. O egípcio, medalhista no Campeonato Mundial de Judô em 2010, foi pressionado por grupos islamitas de seu país para que não enfrentasse Sasson. Depois, foi alvo de duras críticas por ter sido vencido pelo israelense. A IJF emitiu esse ano uma ordem de proibição de participação em torneios internacionais, de quatro anos de duração, contra a Federação de Judô do Irã, após as autoridades esportivas de Teerã exigirem que seus atletas nunca enfrentassem oponentes israelenses.
Na medida em que setores da sociedade ocidental aceitam a falácia do relativismo cultural, a consequência é que os que aderem a essa ideia tentam impor a noção de que não se pode mais criticar as práticas e a moralidade de outras sociedades. Assim, como sinal dos tempos, os principais meios de comunicação no Brasil noticiaram as declarações dos atletas muçulmanos como mero protesto político. Não como racismo e xenofobia – que é o que o antissemitismo de fato é.
Até quando?
Aumentam os ataques à igreja cristã no Ocidente – por meio de leis cerceando as liberdades de pregação, de funcionamento de escolas confessionais, de os pais escolherem a educação dos filhos, do uso de símbolos religiosos, bem como a liberdade de objeção de consciência dos cristãos que se recusam a colaborar com o aborto ou com a celebração de uniões homossexuais –, mas também contra o Estado de Israel. Tanto os cristãos como os judeus são sistematicamente ridicularizados nos meios de comunicação e redes sociais por “intelectuais” esquerdistas, “cristãos progressistas”, artistas “engajados” e a grande mídia em geral, que fazem o que podem para destruir os valores judaico-cristãos, que formaram e nutriram o Ocidente durante séculos.
Os principais meios de comunicação no Brasil noticiaram as declarações dos atletas muçulmanos como mero protesto político. Não como racismo e xenofobia – que é o que o antissemitismo de fato é
Em meio a estes preocupantes sinais, cristãos devem lembrar o que o Senhor Jesus afirmou: “a salvação vem dos judeus” (Jo 4,22). Como explica D.A. Carson, o Messias ensinou que “os judeus estão dentro do curso da revelação salvadora de Deus, [...] eles são o veículo daquela revelação, a matriz histórica da qual aquela revelação emerge. [...] A salvação [...] encontra-se no Messias anunciado pelas Escrituras judaicas”.
Nesse sentido, concluamos com McDermott: “O antissemitismo moderno culminou no Holocausto, em que os nazistas exterminaram 6 milhões de judeus, dois terços da população judaica da Europa. [...] Hoje, o antissemitismo está em ascensão, sendo agravado nas universidades por um movimento de ‘BDS’, isto é, boicotes, desinvestimentos e sanções no tocante a Israel, com os judeus sendo abertamente atacados e mortos na Europa. Seu crime? Serem judeus [...]. Não há como explicar esse mistério da iniquidade recorrente ao longo da história. Contudo, [...] o mal detesta o que é bom. As forças do mal odeiam a fonte do bem: o Deus de Israel. Que melhor maneira pode haver, é possível que imaginem, de destruir sua nêmesis, o Deus de Israel, do que atacar o povo que esse Deus escolheu para ser a luz do mundo? E que melhor maneira de atacá-los do que persuadir os não judeus do mundo todo, ao longo de toda a história, a odiá-los e a tentar exterminá-los? [...] Vivemos dias maus [...]. Dias bons, porém, estão a caminho. O mesmo Deus que suscitou Israel como luz das nações e o Messias de Israel como luz do mundo está em marcha para restaurar este mundo. Será realmente glorioso. Israel estará novamente no centro, como bênção para todas as nações e povos desse mundo restaurado. [...] Embora Israel atraia a hostilidade de muitos hoje, um dia irradiará a luz e o amor do Messias a todos”.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos