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O ex-tenente Ronald Ojeda, no momento de sua captura por agentes a serviço do governo venezuelano em Santiago do Chile.
O ex-tenente Ronald Ojeda, no momento de sua captura por agentes a serviço do governo venezuelano em Santiago do Chile.| Foto: Circuito interno

No mês passado, um grupo de homens disfarçados de policiais invadiu, durante a madrugada, um prédio de apartamentos nos arredores de Santiago, no Chile, e prendeu o ex-tenente venezuelano Ronald Ojeda, que aparece na imagem acima algemado e em trajes sumários.

Ojeda foi sequestrado e seu corpo foi encontrado nove dias depois, nesta sexta-feira, 1.º de março. Ele vivia no Chile, acreditando estar protegido do regime de Nicolás Maduro. Mas as ditaduras têm longos braços.

Em 2017, no auge da repressão aos protestos contra o regime de Maduro, Ojeda foi um entre centenas de militares presos e acusados de traição. No caso, “traição” seria negar-se a matar os compatriotas que se manifestavam pelas ruas do país.

Desde que fugiu da prisão e se refugiou no Chile, Ojeda fazia barulho. Postava denúncias pelas redes e alimentava uma rede de opositores com informações sobre a ditadura venezuelana. O sequestro, desaparecimento e assassinato de Ojeda transformou-se em uma mensagem para todos os ex-militares e opositores que estão no exílio. Ninguém está seguro.

Com o sequestro e assassinato de Ronald Ojeda, no Chile, o regime venezuelano mostrou que não existem barreiras e geográficas para suas ações de repressão

Maduro, que sempre perseguiu a oposição, colocou em prática um processo de “orteguização” de seu regime. Além de ter inabilitado opositores e prendido outros, passou a prender ativistas e qualquer um que o critique, sob a acusação de traição e terrorismo.

Com o sequestro e assassinato de Ojeda, o regime mostrou que não existem barreiras geográficas para suas ações de repressão. O que não é uma novidade para autocratas, mas no caso venezuelano é a estreia de uma escalada de repressão que não respeita fronteiras.

Vladimir Putin, o malvado favorito de esquerdistas e direitistas exacerbados, é um expert no assunto. O caso mais recente de execução de personagens incômodos ocorreu também em fevereiro. As autoridades espanholas encontraram o corpo do ex-piloto russo Maxim Kuzminov, que em agosto do ano passado havia desertado e fugido com um helicóptero militar para a Ucrânia. O episódio alimentou a propaganda de guerra ucraniana e foi um baque para o brio das tropas russas. Na mesma localidade onde ocorreu o assassinato, os policiais localizaram o carro dos assassinos. O veículo havia sido abandonado e incinerado.

Em 2021, o regime de Aleksander Lukashenko – o ditador bielorrusso que é um boneco de ventríloquo de Putin – mandou interceptar no ar um avião comercial da irlandesa Ryanair que sobrevoava o espaço aéreo de seu país, tendo partido da Grécia, com destino à Lituânia. Lukashenko sabia que os jornalistas Roman Protasevich e sua namorada Sofia Sapega estavam a abordo e inventou que havia informações sobre uma bomba pronta para explodir no interior da aeronave. Forçado a descer, o avião foi invadido pelas forças de segurança; Protasevich e Sapega foram levados para a prisão.

Desconsiderando as leis internacionais que protegem as aeronaves e embarcações, Lukashenko, na prática, “invadiu a Irlanda” para capturar na marra críticos de seu regime. O caso gerou protestos. Mas e daí?

Protasevich foi acusado de 1.586 crimes e condenado a oito anos de prisão. Mas... algo insólito aconteceu. Ainda da prisão, ele passou a fazer declarações pró-regime. Um giro de 180 graus que culminou com o fim de seu relacionamento com Sapega; o anúncio do casamento com uma russa, propagandista de ditaduras; e, por fim, seu perdão. Protasevich, agora, é um ferrenho defensor do regime bielorrusso.

Sapega, que não fechou com o regime de Lukashenko, segue obrigada a cumprir pena de seis anos de prisão. Mas, se é que se pode falar em algo positivo diante de tamanhas barbaridades, ela se livrou de um companheiro de quinta categoria.

Para quem acha que essas atrocidades são coisas distantes, não custa lembrar que em 2007 o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mandou prender e deportar os pugilistas cubanos Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara, que abandonaram a delegação cubana que estava no Brasil por ocasião dos Jogos Pan-Americanos. Rigondeaux e Lara acreditavam estar protegidos no Brasil e planejavam buscar uma nova vida longe da ditadura cubana. Mas Lula atuou como uma extensão dos braços de Fidel Castro.

Por meios próprios ou com a ajuda dos amigos, os ditadores estão aumentando seus domínios e influência. Assim, eles querem, pela força do medo, dizer que não há lugar seguro no mundo para seus críticos

Nada, no entanto, se compara ao fenômeno massivo que a China de Xi Jinping está empreendendo. É cada vez mais evidente, devido ao desbaratamento de operações clandestinas dos chineses no exterior, a existência de uma espécie de rede mundial de monitoramento, controle e repressão. Já foram identificadas mais de uma centena de “delegacias de polícia” no exterior. Algumas delas foram descobertas nos Estados Unidos, na Austrália, em vários países europeus e asiáticos. Os relatórios mais recentes falam da atuação da polícia clandestina chinesa em pelo menos 53 países.

Os opositores e minorias étnicas reprimidas são vigiados de perto. Mas não só eles. Qualquer um no exterior que incomode o Partido Comunista Chinês também cai no radar dos policiais clandestinos. Os alvos entram na mira do regime por suas manifestações em redes sociais e qualquer outro canal público, constantemente monitorados pelo regime.

O centro da vigilância é o aplicativo WeChat, uma espécie de WhatsApp chinês, cuja “empresa” controladora possui uma relação umbilical com o PC chinês. A empresa colabora ativamente para ajudar o regime a identificar conversas que possam ser de interesse do regime e provê muito mais. Sua tecnologia permite ao regime rastrear os usuários indicando a sua localização.

Por meios próprios ou com a ajuda dos amigos, os ditadores estão aumentando seus domínios e influência. Assim, eles querem, pela força do medo, dizer que não há lugar seguro no mundo para seus críticos.

Eles estão conseguindo.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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