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Ele é a verdade. Ele é a justiça. Ele tem todos os poderes. Suas leis são nossas leis. Suas ordens não podem demorar a ser cumpridas. E o prazo deve ser curto mesmo. Ele é bonzinho, oferece solidariamente algumas horas para que entendam suas boas intenções e se rendam. Ele é a bondade, o detentor de todas as virtudes. Não há ser mais correto, mais bem intencionado.
Seu argumento é claro: é assim, e pronto. Liberdade de expressão apenas para aqueles que a mereçam, que saibam o que se pode e o que não se pode falar. Onde já se viu? Esqueçam as leis que não são dele, calúnia, injúria, difamação... Esqueçam essa história de que alguém que se sinta prejudicado deve pedir ressarcimento. Ninguém faz pedidos, ninguém tem esse direito, exceto seus companheiros. Todos devem cumprir ordens, as ordens dele, o que a cabeça e o fígado dele determinam.
Nosso pensamento foi sequestrado por um santo homem. O resgate é a purificação da nossa alma. Ele cuida de nós, cuida da nossa vida, é nosso tutor. Só ele sabe que informações devemos receber, só ele sabe o que devemos dizer
Não perguntem, não indaguem, não contestem. Isso é coisa de moleque, de rebelde, de gente que não enxerga o lindo caminho da pacificação por meio do poder absoluto. Pensem como ele, sigam seus ensinamentos. Não façam birra. Ele já explicou tão explicadinho o que é fake news, o que é desinformação. Suas verdades devem ser as verdades de todos. Se você não pensa como ele, sua intolerância fica patente e justifica um castigo.
Parlamentares, campeões de votos, cantores, empresários, jornalistas, comunicadores, calem a boca! Povo nas ruas, povo pacífico e ordeiro, cale a boca! E volte para casa. O autoritarismo está aí para defender nosso bem maior: a democracia. É assim tão difícil de entender? Ou será preciso desencarcerar mais bandidos de verdade e aprisionar metade da população?
Nosso pensamento foi sequestrado por um santo homem. O resgate é a purificação da nossa alma. Ele cuida de nós, cuida da nossa vida, é nosso tutor. Só ele sabe que informações devemos receber, só ele sabe o que devemos dizer. Sua democracia é tão clara: ou pensa como ele ou não pensa. Tão simples.
Não é intimidação nem controle nem manipulação. É carinho, é preocupação paterna, fraterna, é cuidado extremo. Não há nada a denunciar. Temos de agradecer. A luz que vem dele nos guiará. Ele é o mais poderoso dos poderosos de todos os tempos. Devemos ser gratos... Contestar seu reinado é atacar a democracia.
Por isso, se ele perguntar, como aquele antigo personagem de Jô Soares: “Dessa terra que eu amo, desse povo que eu piso o que sou, o que sou, o que sou?” Nós, os pisoteados, devemos responder, num coro só, compreendendo a salvação, a redenção que ele representa: “Sois rei! Sois rei! Sois rei!”
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos