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Elon Musk não sai das manchetes, no Brasil, ou no mundo. O homem mais rico do planeta, dono da Tesla, da Space X e do “X”, dentre muitas outras empresas, chama a atenção e gosta dos holofotes. Seus posicionamentos políticos e, no caso do Brasil, a disputa entre o “X” e o Supremo Tribunal Federal são assuntos obrigatórios e provocam discussões apaixonadas na imprensa e nas redes sociais. O bilionário integra um exclusivo clube de indivíduos superpoderosos, não só economicamente, mas também politicamente e, até certo ponto, alguns deles, militarmente. Estamos testemunhando uma nova era, onde indivíduos com riqueza e influência sem precedentes estão começando a rivalizar com os próprios Estados em poder e alcance. Vamos chamar essas pessoas de “superindivíduos”.
A origem do Estado moderno remonta ao processo de centralização do poder que ocorreu com o fim do feudalismo, entre os séculos XV e XVII, e que culminou com o Tratado de Westfália, de 1648, consolidando o conceito de soberania estatal. Cada nação passou a ter o direito de governar seu território sem interferência externa, o que deu início ao sistema internacional dito anárquico, uma vez que nenhum ente superior detém o poder ou o direito de se sobrepor aos Estados soberanos. Com o tempo, esses Estados ampliaram suas capacidades, controlando os recursos estratégicos, regulando a economia, responsabilizando-se pela diplomacia e pela gestão de infraestruturas cruciais, como comunicações e transportes. O Estado passou a deter o monopólio do emprego legítimo da força.
No entanto, nas últimas décadas, com a aceleração da globalização e o livre fluxo de capitais, com a revolução da tecnologia e o consequente aumento do poder privado, alguns indivíduos adquiriram capacidades que antes eram exclusivas dos Estados.
Hoje, figuras como Elon Musk, Yevgeny Prigozhin e Jack Ma, em diferentes áreas, têm (ou tiveram) a habilidade de influenciar diretamente decisões que moldam o cenário internacional, da mesma forma que os Estados-nação fazem
Elon Musk reúne, ao liderar suas empresas, capacidades que o permitem exercer impacto direto sobre questões globais.
Um exemplo foi sua atuação pessoal para garantir a manutenção das comunicações na Ucrânia, disponibilizando sua rede de satélites Starlink aos ucranianos quando a estrutura de comunicações do país estava destruída pela ofensiva russa do início da guerra. Outro, é o protagonismo que a empresa SpaceX adquiriu na exploração do espaço. Depois de soviéticos e americanos disputarem a corrida espacial à Lua, tudo indica que a primeira astronave a chegar à Marte será bancada por uma empresa privada. Hoje, o programa espacial americano simplesmente não sobrevive sem os foguetes do bilionário.
Se Musk demonstrou o poder privado no campo tecnológico, um russo fez o mesmo na esfera militar. Yevgeny Prigozhin, fundador do Grupo Wagner, famosa empresa russa de mercenários, apesar de ter sido milionário enquanto vivo, nunca teve riqueza comparável à de Musk. Sua presença nesta lista de “superindivíduos” se deve ao poder militar que deteve e que ampliou consideravelmente ao empregar sua tropa a serviço da Rússia, não só na guerra da Ucrânia, mas também em outras partes do mundo, especialmente na África. A atuação de seus mercenários na conquista da cidade ucraniana de Bakhmut foi um feito militar inédito para um grupo militar privado nos tempos modernos. Entretanto, Prigozhin desafiou o Estado russo ao marchar em direção a Moscou, gesto que foi interpretado pelo presidente Putin como traição, selando provavelmente seu destino ao morrer em um desastre aéreo até hoje não totalmente esclarecido. O Grupo Wagner demonstra que a privatização da atividade militar por “Senhores da Guerra” modernos como Prigozhin desafia o monopólio estatal do uso da Força e pode trazer implicações para a própria soberania dos Estados.
O chinês Jack Ma, que chegou a ser considerado o homem mais rico da China, é um terceiro exemplo de um “superindivíduo” que também acabou por desafiar o centralizado poder estatal na China. O fundador do grupo Alibaba, gigante das vendas eletrônicas, tornou-se uma celebridade no país, seguido e admirado por milhões de pessoas. Entretanto, ao perceber um comportamento crescentemente desafiador de Ma, a partir de 2020 o governo chinês tomou uma série de medidas contra seu conglomerado.
A popularidade do empresário despencou, ele passou a ser visto como um vilão e ficou um tempo desaparecido, o que deu origem, na época, a muitas especulações acerca do que lhe teria acontecido. Hoje, ele passa mais tempo no exterior do que na China, tendo sido contratado como professor visitante de uma universidade de Tóquio. Ma confrontou o governo chinês e foi derrotado.
A ascensão de super indivíduos como Elon Musk, Yevgeny Prigozhin e Jack Ma revela uma nova dinâmica de poder, onde figuras privadas acumulam uma influência sem precedentes sobre questões globais. No entanto, como vimos, essa capacidade de desafiar o poder estatal tende a provocar reações dos próprios Estados, que ainda controlam estruturas fundamentais como as forças armadas e o aparato legal.
Embora, até agora, os Estados tenham prevalecido sobre esses indivíduos, a crescente interdependência entre tecnologia, economia e segurança vai continuar a expandir o poder desses atores, que provavelmente continuarão a surgir. Resta saber até que ponto a soberania estatal conseguirá conter o avanço desses indivíduos, que cada vez mais operam como “mini-Estados” no cenário global.
Conteúdo editado por: Aline Menezes