
Ouça este conteúdo
Ainda está muito longe de ser suficiente, muito menos ideal, mas, nos últimos anos, temos tido o privilégio de ter acesso à tradução de muitos livros especializados sobre a União Soviética. Temos mais uma dessas traduções fresquinhas chegando ao nosso mercado editorial, e é difícil imaginar uma adição melhor ao nosso catálogo nacional.
Neste mês, a editora Caravelas deu um verdadeiro presente ao público brasileiro interessado em estudar o cataclisma soviético da fome dos anos 30, conhecida na Ucrânia como Holodomor. O livro é “Os Anos da Fome – Agricultura Soviética 1931–1933” (em inglês, The Years of Hunger: Soviet Agriculture, 1931–1933), escrito por dois dos maiores especialistas da história econômica soviética, R. W. Davies e S. G. Wheatcroft.
Fui convidado pela editora para escrever o prefácio deste livro, pois, segundo a empresa, sou o “principal divulgador desta obra aqui no Brasil” por meio dos meus vídeos no Brasão de Armas sobre o Holodomor.
Fico modestamente orgulhoso por isso: saber que meus vídeos tiveram um impacto tão grande no público e tornaram conhecida essa e outras obras tão relevantes é algo que me deixa realizado como historiador e divulgador da história soviética da maneira mais objetiva possível.
O livro é pesado: são 700 páginas repletas de tabelas e estatísticas, que serão muito úteis para aqueles que realmente querem entender a complexidade daquele terror brutal que se abateu sobre a população soviética, tirando a vida, segundo as estimativas dos próprios autores, de cerca de 5,7 milhões de pessoas na URSS; um cataclisma populacional jamais sentido pela Rússia e pelos povos vizinhos até a Segunda Guerra Mundial.
Embora os professores deixem claro que a fome, como aconteceu, foi o resultado complexo de muitos fatores, uma causa foi crucial para a “deterioração da agricultura”: as políticas estatais violentas contra o campo, conhecidas como coletivização. Nas palavras dos professores: “A luta desesperada do Estado para explorar os camponeses até à morte foi descrita como uma batalha justa contra a contrarrevolução” (itálico meu).
Os professores mostram que o governo comunista foi criminoso de outra maneira: escondeu e negou a fome para o mundo. A preocupação de Stálin não era com a vida dos camponeses, mas com o futuro da industrialização, como eles escreveriam mais tarde em outro artigo sobre o tema.
Por que estudar esse livro? Porque a história se repete. Ela se repetiu na China décadas depois, levando a um número ainda mais impressionante de mortos. E pode se repetir hoje, se não estivermos atentos. Estudar Os Anos da Fome é uma forma de protegermos nossa tão valiosa agricultura enquanto honramos aqueles mortos de forma tão desumana por um Estado comunista desumano.
Este texto não é uma promoção paga da editora, e o autor não recebeu qualquer valor dela para escrevê-lo.




