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Balanço

As vitórias e derrotas da agenda econômica do governo no Congresso

Bolsonaro e Guedes: governo conseguiu aprovar algumas de suas prioridades, mas não conseguiu avançar com reformas estruturantes em 2021. (Foto: Clauber Cleber Caetano/PR)

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O governo de Jair Bolsonaro conseguiu aprovar no Congresso Nacional algumas das pautas prioritárias de sua agenda econômica, mas outras – incluindo promessas de campanha – avançaram pouco em 2021, especialmente a agenda de reformas estruturais, e seguem sem perspectiva de aprovação no Legislativo.

Na análise de especialistas e políticos, a chance de aprovar matérias como essas diminui à medida que o país se aproxima das eleições presidenciais. Embora o ministro da Economia, Paulo Guedes, busque manter o otimismo, o próprio presidente da República admitiu que a janela de aprovação de algumas pautas já se fechou.

"Essas reformas têm que acontecer no primeiro ano de cada governo. Já estamos praticamente terminando o terceiro ano [de governo]. Se não aprovar neste ano, no ano que vem pode esquecer", disse Bolsonaro no fim de outubro.

Na mesma linha, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), afirmou que "não há chance de aprovação das reformas" administrativa e tributária em 2022. Um dos mais experientes articuladores do Congresso, Barros disse ao "Valor" na semana passada que a disputa eleitoral vai contaminar a análise dos parlamentares.

Em 2021, projetos prioritários do governo – como a privatização dos Correios e as reformas administrativa e tributária, entre outros – não receberam o aval do Congresso. Para observadores, houve falhas na articulação e perda de apoio político. Além disso, nos últimos meses o próprio Executivo concentrou esforços na aprovação da PEC dos precatórios, para abrir espaço no Orçamento para a ampliação do Auxílio Brasil e outros gastos.

Por outro lado, o governo contabiliza algumas vitórias importantes da agenda econômica no Congresso em 2021. Como, por exemplo, a aprovação da privatização da Eletrobras, da medida provisória que cria o programa de transferência de renda Auxílio Brasil, da PEC dos precatórios e de projetos de lei como a BR do Mar e os marcos legais do câmbio e das ferrovias.

Confira a seguir as principais vitórias e derrotas da agenda econômica do governo no Congresso em 2021:

Vitórias

Privatização da Eletrobras

Em 2021 o governo Jair Bolsonaro conseguiu aprovar a primeira privatização de estatal de controle direto da União: a desestatização da Eletrobras. A operação de venda da companhia está prevista para 2022.

A medida provisória 1.031, que abriu caminho para a privatização, foi enviada ao Congresso em fevereiro deste ano. O texto foi amplamente modificado pelos parlamentares e ganhou "jabutis" (acréscimos sem relação com o tema central) como a obrigação de contratar pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) e termelétricas movidas a gás onde hoje não há suprimento do combustível. Apesar das críticas, o Congresso não abriu mão e inseriu na MP um parágrafo de 652 palavras e 3.197 caracteres com o objetivo de evitar um eventual veto do presidente à questão. A matéria foi aprovada em junho de 2021. Ao todo, Bolsonaro vetou 14 pontos do projeto, mas manteve a contratação de PCHs e térmicas.

O Executivo espera que a privatização da Eletrobras gere uma arrecadação de R$ 100 bilhões aos cofres públicos. Mas restam ainda alguns passos para a conclusão do processo.

As definições de premissas fundamentais à modelagem da capitalização estão sendo feitas pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que é ligado ao Ministério de Minas e Energia (MME). Trata-se de um órgão de assessoramento do Presidente da República para a formulação de políticas e diretrizes de energia. Ainda será preciso finalizar a modelagem da operação de capitalização, liderada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O Tribunal de Contas da União (TCU) também precisa analisar o processo para detectar possíveis irregularidades e então homologar a operação. O aval do tribunal é essencial para reduzir chances de judicialização do processo de venda e dar segurança jurídica aos interessados. Até agora, contudo, o TCU já adiou a conclusão da análise por duas vezes, após identificar inconsistências no processo. Isso poderia atrasar a capitalização e, até mesmo, inviabilizá-la em 2022.

A privatização será feita por meio do modelo de capitalização, a partir da emissão de novas ofertas públicas de ações da estatal. Os atuais acionistas terão seu capital diluído e o governo federal, que hoje detém 51% das ações, perderá a posição de acionista controlador. A União terá direito a uma golden share, ação de classe especial que lhe garante poder de veto em decisões da assembleia de acionistas.

A hidrelétrica binacional Itaipu e a Eletronuclear não podem ser privatizadas, e serão geridas por uma nova estatal com esse fim, a ENBPar, criada em setembro.

PEC dos precatórios

Outra vitória de Bolsonaro foi a aprovação "PEC dos precatórios" no Congresso. A proposta acabou sendo promulgada de forma fatiada pela falta de consenso entre os parlamentares sobre determinados trechos do texto.

Entre outras coisas, a proposta de emenda à Constituição adia o pagamento de parte dos R$ 89,1 bilhões em precatórios que o governo deveria pagar no ano que vem, e ao mesmo tempo altera a regra de correção do teto de gastos, principal âncora fiscal do país. Essas medidas, combinadas, devem permitir um gasto adicional de mais de R$ 106,1 bilhões em 2022, além de espaço para R$ 15 bilhões extras no Orçamento de 2021.

O principal objetivo das mudanças foi permitir a ampliação do orçamento do programa social Auxílio Brasil. Em vez dos R$ 34,7 bilhões originais, o programa terá cerca de R$ 89 bilhões, conforme o Orçamento aprovado pelo Congresso em 21 de dezembro.

O pagamento das sentenças judiciais será limitado até 2036 ao mesmo índice usado para corrigir o teto de gastos, tomando 2016 como primeiro ano. Dessa forma, o montante de R$ 89,1 bilhões que a União deveria desembolsar com os precatórios no próximo ano cairá para cerca de R$ 40 bilhões.

Com relação ao teto de gastos, a proposta muda sua fórmula de correção. A correção anual dos limites de despesas primárias da União, antes feita com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado até junho do ano anterior, passa a ser feita pelo IPCA acumulado de janeiro a dezembro. Com a PEC, o presidente da República no exercício de 2026 também fica impedido de modificar novamente o método de correção do teto, já que a revisão foi antecipada.

A PEC também torna permanente o Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família, e incorpora ao texto constitucional o princípio da renda básica. A proposta aprovada ainda garante que toda folga de recursos aberta nos próximos anos será direcionada para o pagamento do Auxílio Brasil e outras despesas sociais.

Auxílio Brasil

Neste ano, o programa Bolsa Família foi encerrado e, em seu lugar, o governo lançou o Auxílio Brasil, voltado a famílias em situação de pobreza e extrema pobreza. A medida provisória que cria o programa foi aprovada pelo Senado em dezembro.

O novo programa do governo amplia a linha de corte de acesso das famílias ao programa. A linha de extrema pobreza subiu de R$ 100 para R$ 105 e da pobreza, de R$ 200 para R$ 210. Todas as famílias contempladas pelo Bolsa Família – cerca de 14,5 milhões – foram automaticamente transferidas para o rol de beneficiários do novo programa, sem necessidade de recadastramento.

Com a aprovação da PEC dos precatórios, o governo pretende aumentar para 17 milhões o número de famílias beneficiárias. A União ainda terá de prestar contas do programa ao Congresso anualmente.

O Auxílio Brasil também retira a limitação de cinco beneficiários por família, incluindo a nutriz (mulher que amamenta) na composição familiar, e os beneficiários poderão sacar o recurso em caixa lotérica e não apenas em agências da Caixa Econômica Federal.

Segundo o Orçamento de 2022, a previsão é de benefício médio de R$ 415 por família.

Marco legal das startups

Em maio deste ano o governo contabilizou outra vitória da agenda econômica: a aprovação do projeto de lei complementar que institui o Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador. Entre outras coisas, o PL estabelece um ambiente regulatório facilitado para que empresas inovadoras consigam desenvolver suas operações no Brasil.

O PL aprovado trata das definições legais, ambiente regulatório, medidas de aprimoramento do ambiente de negócios, aspectos trabalhistas, fomento ao desenvolvimento regional das startups, participação do Estado em startups, e alterações na Lei do Simples para contemplar startups e incentivos aos investimentos.

O marco ainda cria o chamado "ambiente regulatório experimental". Trata-se de um regime onde a empresa por lançar novos produtos e serviços experimentais com menos burocracia e mais flexibilidade no seu modelo.

Marco legal do câmbio

Neste ano, o Congresso também concluiu a aprovação do novo marco legal do câmbio, outra prioridade do governo. A proposta foi enviada pelo Executivo ao parlamento em 2020.

Uma das principais mudanças é a autorização para abertura de conta em moeda estrangeira no Brasil, que ainda será regulamentada pelo Banco Central.

O novo marco regulatório também estabelece medidas para aumentar a concorrência no setor de câmbio, permite a bancos e instituições financeiras brasileiras investirem no exterior recursos captados aqui ou lá fora e facilita o uso da moeda brasileira em transações internacionais. O marco altera, ainda, de R$ 10 mil para US$ 10 mil o limite de dinheiro em espécie que cada passageiro pode portar ao sair ou chegar ao Brasil.

Entre outras mudanças previstas pelo marco está a autorização para negociações de pequenos valores entre pessoas físicas no valor de US$ 500, o aumento de casos em que será permitido o pagamento em moeda estrangeira de obrigações devidas no território nacional e pagamentos de contratos de arrendamento mercantil (leasing) feitos entre residentes no Brasil se os recursos forem captados no exterior.

BR do Mar

Outra prioridade do governo Bolsonaro que recebeu aval do Congresso é o programa BR do Mar, que busca incentivar a navegação de cabotagem (entre portos do país). O programa permite o uso de navios estrangeiros na navegação de cabotagem, sem a obrigação de contratar a construção de embarcações em estaleiros brasileiros.

Além disso, com a aprovação do programa, empresas poderão alugar um navio vazio para uso na navegação de cabotagem e, após quatro anos de transição, o afretamento de navios estrangeiros será livre.

A intenção governo é passar de 1,2 milhão de TEUs (unidade equivalente a 20 pés) de contêineres transportados por ano para 2 milhões de TEUs até 2022. O governo também espera ampliar em 40% a capacidade da frota marítima dedicada à cabotagem nos próximos três anos.

Marco legal das ferrovias

Outra vitória recente do governo foi a aprovação do marco legal das ferrovias, que define novos instrumentos de outorga para ferrovias em regime privado. A principal novidade trazida pela lei é a modalidade de autorização para a construção de novas ferrovias, antes concedidas somente por licitação. A expectativa do governo é de que a mudança diminua a burocracia dos processos e atraia investimentos – pelos cálculos do governo, a medida já garantiu aportes de R$ 150 bilhões no setor.

Segundo o que prevê a proposta aprovada, o prazo dos contratos poderá ser de 25 a 99 anos, prorrogáveis. Por meio de convênio, o governo federal poderá delegar a estados, Distrito Federal e municípios a exploração dos serviços. A outorga de ferrovias também será permitida em regiões geográficas ou entre cidades nas quais já existem ferrovias.

Os interessados poderão pedir autorização diretamente ao agente regulador, apresentando estudo técnico, cronograma e certidões de regularidade fiscal. O regulador deverá analisar se a ferrovia atende à política nacional de transporte ferroviário, e poderá negar autorização se o interessado não seguir as regras do projeto, se houver incompatibilidade com a política para o setor ou por motivo técnico-operacional relevante justificado.

Derrotas

Privatização dos Correios

Uma das grandes apostas do governo no campo da privatização, a desestatização dos Correios acabou "estacionada" no Congresso Nacional em 2021. Embora tenha sido aprovada pela Câmara dos Deputados, a matéria não foi adiante no Senado, onde tramita na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).

Responsável pelo relatório da matéria, o senador Otto Alencar (PSD-BA) decidiu adiar o debate diante da resistência da oposição e dúvidas manifestadas por alguns partidos. Para críticos, a proposta é inconstitucional, já que a Carta Magna determina que compete à União manter o serviço postal e o correio aéreo nacional.

Contrários à privatização levaram o assunto ao Supremo Tribunal Federal (STF). Uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) proposta pela ADCAP contesta a privatização da estatal. Nessa ação, a Procuradoria-Geral da República (PGR) já se manifestou contrária à desestatização total da companhia. O próprio STF também já se manifestou sobre a questão, ainda em 2005, ao definir que os serviços postais devem ser prestados pelo Estado.

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O que o projeto de lei faz é estabelecer que essa manutenção "dar-se-á pela garantia da prestação do serviço postal universal e pela regulação e organização do Sistema Nacional de Serviços Postais". Isso vai se dar por meio de concessão, e o novo operador da empresa deverá obedecer o comando de um serviço postal universalizado, atendendo a toda a população e assegurando a continuidade do serviço postal universal.

Um outro motivo que impede o avanço da pauta é a falta de acordo sobre o chamado "valuation". Segundo o presidente da CAE, o montante previsto para a venda da estatal é de cerca de R$ 1 bilhão, valor semelhante ao lucro anual da empresa.

Pela proposta em análise, a venda dos Correios será feita em um leilão e, o comprador da estatal terá de assumir a concessão para a manutenção dos serviços postais em todas as regiões do país. Embora encerre o monopólio dos Correios sobre esse serviço, abrindo espaço a outras empresas, o texto determina que a companhia, após a privatização, ainda será a única prestadora por "pelo menos cinco anos".

A proposta legislativa também cria um marco regulatório para o setor, hoje em regime de monopólio, e define normas gerais para o Sistema Nacional de Serviços Postais (SNSP), além de direitos e deveres dos consumidores e regras genéricas para as empresas privadas que entrarem no mercado postal. O PL ainda estabelece que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) terá suas competências alteradas e passará a se chamar Agência Nacional de Comunicações (Anacom), regulando também os serviços postais.

Na avaliação do governo, para que a privatização possa ser realizada ainda em 2022, o Legislativo precisa concluir a aprovação da proposta até março ou abril, o que daria tempo para as demais etapas da tramitação. O Tribunal de Contas da União (TCU), por exemplo, só pode avaliar o projeto após a aprovação do Congresso, e necessita de pelo menos 90 dias para a análise.

Reforma administrativa

Tida como uma das mais difíceis de serem aprovadas, a reforma administrativa, enviada pelo governo ao Congresso em setembro de 2020, também está parada no Legislativo. Embora aprovada em comissão especial da Câmara dos Deputados em setembro deste ano, a proposta segue sem previsão de votação em plenário. Para analistas, a janela de aprovação da reforma teria terminado não apenas este ano, mas no próximo, tendo em vista a proximidade das eleições presidenciais em 2022.

A agenda de reformas sempre foi anunciada como prioridade da equipe econômica, especialmente em 2021, após os reflexos deixados pela pandemia de Covid-19. Contudo, nem o presidente Jair Bolsonaro nem a base aliada fizeram grandes esforços para acelerar a tramitação.

Entre os principais pontos da reforma administrativa que tramita no Congresso está a previsão de estabilidade a todos os servidores, ainda que com possibilidade de demissão por desempenho insuficiente, corte transitório de jornada de trabalho em até 25%, com redução de remuneração em caso de crise fiscal, permissão para contratação temporária pelo prazo máximo de dez anos, travas para "privilégios" e fim da aposentadoria compulsória.

Reforma tributária

Entregue em julho de 2020 ao Congresso, a primeira fase da reforma tributária proposta pela equipe de Bolsonaro também não avançou na Câmara dos Deputados. Entre outras coisas, o projeto unifica PIS e Cofins em um novo tributo, a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 12%. A proposta nem sequer tem relatório.

O governo até conseguiu aprovar na Câmara o PL 2337/2020, que altera as regras do Imposto de Renda. Entre outras coisas, a proposta aumenta a faixa de isenção para pessoa física e recria a taxação sobre lucros e dividendos. No Senado, porém, a matéria "estacionou" sob fortes críticas do relator escolhido, Angelo Coronel (PSD-BA).

Com isso, Bolsonaro entrará no ano eleitoral sem ter conseguido cumprir uma promessa de campanha: elevar a faixa de isenção do Imposto de Renda. Em 2018, ele prometeu que quem ganhasse até R$ 5 mil não pagaria o imposto; mais recentemente, baixou essa faixa para R$ 3 mil. No fim, a proposta oficial do governo foi de R$ 2,5 mil, e não passou.

O senador Angelo Coronel nem sequer entregou parecer sobre a reforma proposta pelo governo e, recentemente, apresentou um projeto em separado para corrigir apenas a tabela do tributo da pessoa física. Nessa proposta, a faixa de isenção seria de R$ 3,3 mil.

Outras propostas

Outras propostas, também tidas como prioridade pelo governo, não foram aprovadas pelo Legislativo em 2021. São elas:

  • Marco do Setor Elétrico (Projeto de Lei 414/2021);
  • Marco Legal do Reemprendedorismo (PLP 33/20);
  • Marco Legal das PPPs, as Parcerias Público-Privadas (PL 7063/17);
  • Projeto das Debêntures de Infraestrutura, que cria novos instrumentos financeiros para projetos de infraestrutura (PL 2646/20);
  • Nova Lei de Praticagem (PL 2149/15);
  • PEC da extinção dos fundos públicos (PEC 187/19);
  • Nova lei de licenciamento ambiental (PL 3729/04);
  • Mineração em terras indígenas (PL 191/20);
  • Reforma da lei de concessões florestais (PL 5518/20); e
  • Regime de partilha de produção de petróleo (PL 3178/19).

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