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Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, discursa ao lado do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no plenário da Câmara dos Deputados, durante promulgação da emenda constitucional da reforma tributária.
Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, discursa ao lado do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no plenário da Câmara dos Deputados, durante promulgação da emenda constitucional da reforma tributária.| Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Em sua jornada para aumentar a arrecadação e atingir o equilíbrio fiscal, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, contou, em 2023 com a “ajuda” de decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF). Em pelo menos 16 importantes julgamentos tributários, a União saiu vitoriosa na disputa com contribuintes.

Se considerar as discussões que envolveram tributos estaduais e municipais, o placar para o pagador de impostos fica ainda pior: foram 34 vitórias para os entes públicos em 49 julgamentos, segundo levantamento do escritório Machado Associados, divulgado pelo jornal “Valor Econômico”. Estão incluídas na conta teses analisadas em recursos repetitivos, repercussões gerais ou consideradas relevantes pelos autores.

Somente no primeiro semestre, a União venceu dez de 14 julgamentos tributários realizados nas cortes superiores. Em um único caso, no qual o STF autorizou a União a cobrar IRPJ e CSLL sobre incentivos fiscais concedidos por estados via ICMS, o potencial de arrecadação adicional chega a R$ 47 bilhões, segundo cálculos atualizados pela Receita Federal.

A ajuda do STF ao Tesouro inclui ainda o julgamento que relativizou a chamada coisa julgada ao “quebrar” uma decisão antes considerada definitiva sobre a cobrança de CSLL. Não há uma estimativa do potencial de receita que o caso deve gerar – a própria Receita considera um impacto fiscal “reduzido”. A decisão, no entanto, criou precedente para a possibilidade de decisões transitadas em julgado poderem ser revistas, segundo especialistas.

O Supremo formou maioria ainda para garantir a incidência de impostos federais como PIS e Cofins sobre receitas financeiras, como juros, em sentença desfavorável a bancos, corretoras de valores mobiliários, cooperativas de crédito e seguradoras. O impacto, para o Fisco, poderia chegar a R$ 119 bilhões, mas a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) calcula que o débito estaria em R$ 12 bilhões, uma vez que várias instituições financeiras já estavam pagando os tributos desde 2015.

Entre os casos que envolvem os Estados e o Distrito Federal, está a autorização para a cobrança do diferencial de alíquotas (Difal) do ICMS a partir de 5 de abril 2022 – contribuintes defendiam que o recolhimento valesse apenas a partir de 2023. O impacto estimado é de cerca de R$ 10 bilhões.

“É positivo para o país que o Estado brasileiro tenha suas políticas tributárias ratificadas pelo Judiciário”, disse o procurador Paulo Mendes ao “Valor”. Segundo ele, é um recado para as empresas de que o Estado vem agindo dentro da legalidade e da Constituição. “Imagine se metade dos tributos brasileiros fossem inconstitucionais. Seria um caos o país.”

Em outra decisão importante para as contas do governo – que, nesse caso não pode ser considerada uma derrota para o contribuinte –, o STF liberou o pagamento de precatórios por meio de crédito extraordinário, de modo a não infringir as regras fiscais. O entendimento permitiu que R$ 95 bilhões em dívidas reconhecidas pela Justiça fossem quitados em 2023 sem elevar o déficit primário.

Mudança na relação com tribunais pode ter contribuído para vitórias do governo

A sequência de sentenças favoráveis à União pode ser atribuída em parte a mudança na relação entre o Executivo e os tribunais. Poucos dias após o início do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda em janeiro de 2023, o governo instituiu o chamado Conselho de Acompanhamento e Monitoramento de Riscos Fiscais Judiciais.

O grupo inclui Haddad, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e o advogado-geral da União, Jorge Messias. “Nós vamos atuar tecnicamente nos tribunais com muita força”, disse o ministro da Fazenda ao anunciar a estrutura.

Entre os objetivos do Conselho está “fomentar a adoção de soluções destinadas a fortalecer e subsidiar as atividades dos órgãos de representação judicial da União, das suas autarquias e das suas fundações, no acompanhamento de eventos judiciais capazes de afetar as contas públicas”.

O próprio Haddad conversou diretamente com integrantes da 1.ª Seção do STJ durante o julgamento referente à tributação federal sobre incentivos estaduais. Dias depois, o grupo esteve ainda com o ministro do STF André Mendonça, para tratar do assunto.

Em setembro, o conselho divulgou um conjunto de medidas para “aprimorar o monitoramento de riscos fiscais judiciais”, que inclui, entre outras ações, “o estabelecimento de ações conjuntas com o Poder Judiciário para solucionar litígios”.

Em outubro, após receber Haddad e Messias, além dos ministros das Cidades, Jader Filho, e do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, e a presidente da Caixa, Rita Serrano, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, concordou em retirar de pauta um julgamento sobre o índice de correção do FGTS que estava marcado para o dia 18 daquele mês.

Especialistas se dividem sobre interlocução do governo com STF e STJ

O expediente divide especialistas entre quem considera a interlocução como “parte do jogo” e quem vê interferência indevida entre diferentes Poderes.

“É notório que nos últimos anos os tribunais superiores estão relativizando os comandos contidos na carta constitucional, de modo a atender interesses políticos”, disse à Gazeta do Povo Luciano Ogawa, advogado tributarista sócio do Ogawa, Lazzerotti e Baraldi Advogados.

No mês passado, em entrevista ao programa “Roda Viva”, da TV Cultura, o ministro da Fazenda defendeu que o cumprimento da meta de zerar o déficit primário em 2024 não é prerrogativa exclusiva de sua pasta e incluiu o Judiciário na equação.

“Não vai ser um ministro que vai conseguir entregar um resultado. Eu dependo do Judiciário, dependo do Executivo e do Legislativo. E até agora eu não posso reclamar de ninguém”, declarou.

Em sua cruzada contra a desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia, Haddad já sinalizou que pode recorrer ao STF para questionar a decisão do Congresso de prorrogar o benefício até 2027.

“Não existe da nossa parte nenhum ânimo de antagonizar. Nós queremos uma solução. Então nós vamos buscar o auxílio do Judiciário neste caso, mas também vamos apresentar ao Congresso [...] uma alternativa ao que foi aprovado”, disse, em dezembro, antes da publicação da medida provisória (MP) 1.202, que estabelece a reoneração gradativa dos setores beneficiados pela medida.

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