A apenas dois dias do segundo turno das eleições, Fernando Haddad (PT), candidato ao governo de São Paulo, aposta em desgastes envolvendo o adversário Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos) e seu padrinho político, Jair Bolsonaro (PL), para tentar virar votos.
O petista, aliado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), largou em desvantagem no primeiro turno: em 2 de outubro, Tarcísio obteve 42,32% dos votos, contra 35,70% de Haddad.
Além de ter feito uma votação maior, o candidato do Republicanos conseguiu angariar o apoio do atual governador paulista, Rodrigo Garcia (PSDB), que tentava a reeleição. Garcia teve 18,40% dos votos, e afirmou estar “incondicionalmente” ao lado de Tarcísio e Bolsonaro.
Nesta reta final, o principal foco de ataque por parte de Haddad tem sido o caso envolvendo a campanha de Tarcísio e um tiroteio em Paraisópolis, na capital paulista. Desgastes envolvendo Bolsonaro também podem respingar no candidato do Republicanos, já que a campanha dos dois anda lado a lado em São Paulo.
Apesar de colocar Tarcísio em posição defensiva a poucos dias da eleição, é difícil dizer qual será o impacto dos casos sobre a votação, segundo analistas ouvidos pela Gazeta do Povo.
O caso em Paraisópolis
Um dos casos polêmicos envolve Tarcísio diretamente. No início da semana passada, em 17 de outubro, o candidato e sua equipe cumpriam agenda de campanha em Paraisópolis, na capital paulista, quando foram interrompidos por um tiroteio. Um homem foi morto.
De início, o próprio candidato afirmou, em post nas redes sociais, que ele e sua equipe haviam sido “atacados por criminosos”. Depois, Tarcísio disse que o tiroteio não tinha cunho político, mas que foi uma “tentativa de intimidação” por parte de criminosos. O caso foi parar na propaganda de TV de Bolsonaro, que também lembrou da facada sofrida pelo presidente durante a campanha de 2018.
Segundo a Polícia Civil, o tiroteio ocorreu no entorno do prédio em que estava o candidato. A versão da polícia é de que oficiais à paisana que trabalhavam na segurança de Tarcísio teriam percebido uma movimentação de indivíduos em motos, trocando armas. Os policiais teriam se sentido acuados e, então, teve início o tiroteio.
A situação parecia encerrada. Mas, nesta semana, um áudio divulgado pelo jornal Folha de S.Paulo mostra um integrante da campanha de Tarcísio pedindo para que um cinegrafista da Jovem Pan apagasse imagens que fez do caso. A equipe do candidato reconheceu o pedido, afirmando que o objetivo era “não expor quem estava lá”.
Quando ocorreu o pedido, porém, as imagens já haviam sido enviadas à emissora. A Jovem Pan afirmou, em nota à Folha, que exibiu todas as imagens feitas durante o tiroteio, e que não houve contato da campanha do candidato com a direção da emissora para restringir a exibição das imagens.
O próprio candidato disse que o pedido pode ter sido feito em um “momento de tensão”, para “preservar a identidade de pessoas que fazem parte da nossa segurança”. “Eu não estou mais falando no assunto, a imprensa toda hora traz esse assunto para a pauta, não tem sentido. O interesse é fazer sensacionalismo, é dar uma causada”, completou.
Nesta quinta-feira (27), o cinegrafista envolvido no caso afirmou que a equipe de Tarcísio pediu que ele fosse demitido após a divulgação do áudio. A campanha do candidato nega.
Equipe de Tarcísio cometeu "ato ilícito", diz Haddad
Diante do caso, Fernando Haddad fez críticas a Tarcísio, dizendo que sua equipe cometeu um “ato ilícito”. “O áudio é muito grave, porque é uma pessoa da equipe do Tarcísio praticamente intimidando um cinegrafista a apagar imagens do que aconteceu em Paraisópolis”, afirmou, em sabatina da Folha/UOL.
O episódio também levantou críticas ao posicionamento do próprio Tarcísio em relação a câmeras usadas por policiais nas fardas. O candidato já defendeu que a polícia deixasse de usar a ferramenta mas, depois, voltou atrás.
No debate realizado pela Globo na quinta-feira (27), Haddad perguntou se Tarcísio concordava com o pedido de sua equipe para que as imagens fossem apagadas.
"Você acha que aquele companheiro seu agiu corretamente ao constranger um profissional da imprensa a apagar imagens de um evento onde aconteceu um homicídio, em circunstâncias que ainda estão sendo apuradas?", questionou o petista.
Tarcísio respondeu dizendo que lamentava o "sensacionalismo" do adversário em relação ao caso. Ele confirmou o pedido para que as imagens fossem apagadas, dizendo que a preocupação de sua equipe era com as pessoas que estavam lá e poderiam ser identificadas depois.
"A gente estava com o cinegrafista porque não deixamos ninguém ficar para trás. Quando houve o tiroteio, a gente se preocupou em trazer todo mundo para a nossa van, que era blindada. (...) A nossa preocupação era com a segurança [de todos, inclusive da imprensa], porque fomos abordados por criminosos", completou.
Polêmicas afastam eleitor indeciso
O próprio presidente Jair Bolsonaro também teve episódios de desgaste na última semana, como o caso envolvendo Roberto Jefferson. No domingo (23), o ex-deputado, aliado do presidente, atirou e jogou granadas em policiais federais que tentavam prendê-lo. A prisão foi decretada pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), por causa do descumprimento de medidas cautelares.
Para Maria Teresa Kerbauy, professora da Unesp (Universidade Estadual Paulista) no campus Araraquara, os casos podem atingir os eleitores mais moderados e indecisos, que são determinantes tanto na eleição para governador quanto para presidente.
“O eleitor que apoia Bolsonaro já tem a intenção de voto cristalizada, assim como o que não o apoia. Estão mesmo em disputa aqueles que estão na dúvida em quem votar, e é para eles que esses episódios acabam pesando”, afirma a professora.
Kerbauy avalia, ainda, que o clima de “já ganhou” pode não ter sido bom para Tarcísio. “Ninguém ganha a eleição antes do dia. É só depois que se pode indicar secretários”, completa.
Com ventos soprando a seu favor, o candidato do presidente citou nomes para um futuro secretariado. Em entrevista ao canal do YouTube Talk Churras, o ex-ministro de Bolsonaro afirmou, por exemplo, que Guilherme Afif Domingos, coordenador de seu plano de governo, integraria o primeiro escalão da gestão. Tarcísio também citou Eleuses Paiva como possível nome para a Saúde e Samuel Kinoshita como cotado para a Fazenda.
Tarcísio segue favorito, diz analista
Na opinião de Cristiano Noronha, vice-presidente da consultoria Arko Advice, Tarcísio continua favorito no próximo domingo (30) mesmo com o desgaste. Segundo ele, porém, há a possibilidade de Haddad conseguir usar os casos de Jefferson e de Paraisópolis para atrair votos. “Mas o PT continua enfrentando resistências no estado de São Paulo”, pondera Noronha.
No primeiro turno, Tarcísio ganhou na maior parte do interior paulista, enquanto Haddad venceu na capital. Lula também ficou atrás de Bolsonaro no estado: o petista teve 40,89% dos votos entre os paulistas, contra 47,71% do presidente.
Segundo Noronha, mesmo sem vitória petista, um bom resultado em São Paulo pode pavimentar o caminho para que Haddad ocupe posição de destaque em um eventual governo Lula. “Eventualmente ele pode ser até um dos sucessores [de Lula]”, avalia.
Haddad disputou as eleições presidenciais em 2018 depois que Lula foi impedido de concorrer. No segundo turno, ele teve 44,87% dos votos. Bolsonaro foi eleito com 55,13%.
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