A carga tributária é um dos grandes desafios enfrentados por empresas no Brasil. Mesmo com a esperada correção de alguns desequilíbrios, a partir da aprovação da reforma tributária pelo Congresso Nacional, no final do ano passado, o detalhamento de como serão cobrados os novos impostos ainda tira o sono de muitos empresários.
Ainda sem uma definição clara em torno da regulamentação da reforma e com um longo caminho até sua implantação completa, o Brasil continua na 10ª posição entre os sistemas tributários mais complicados em uma lista de 69 países, segundo o ranking Tax Complexity.
Como os tributos são inerentes ao funcionamento do negócio, respondendo em geral por praticamente 30% dos seus custos, o planejamento tributário surge como resposta à necessidade de minimizar sua pressão.
O plano abrange, em resumo, um conjunto de estratégias administrativas e operacionais que podem ser adotadas por empresas para antecipar e organizar sua carga tributária, para reduzir o impacto dos impostos e até tirar vantagens do regime tributário, quando possível.
Estratégias legais
Diferente do que muitos podem pensar, estratégias de eficiência fiscal não buscam fugir da lei ou do pagamento de impostos. Elas permitem que empresas se beneficiem de oportunidades, garantindo economia significativa sem riscos legais.
As formas de otimizar a tributação variam conforme o perfil de cada empresa, mas, em geral, podem ser divididas em táticas operacionais, que preveem como as questões fiscais serão tratadas no dia a dia a curto prazo; preventivas, cuja principal finalidade é a escolha do regime; estratégicas, com metas a longo prazo; corretivas, para lidar com situações inusitadas; e especiais, em contextos específicos.
Esse tipo de planejamento começa com medidas administrativas internas, que demandam uma análise minuciosa da operação empresarial. A partir desse mapeamento é possível escolher o melhor regime de tributação (Simples Nacional, Lucro Presumido ou Lucro Real) e identificar meios de economia fiscal.
O regime deve ser adequado ao porte da empresa, já que somente esta escolha, se feita de maneira correta, pode trazer algum tipo de benefício para o negócio. Por exemplo, enquanto pequenas empresas podem optar pelo Simples Nacional, que oferece alíquotas reduzidas e simplificação tributária, negócios com margens de lucro menores podem se beneficiar do Lucro Real, em que os tributos são calculados sobre os ganhos efetivamente apurados.
A interpretação das nuances da legislação fiscal vigente também pode influenciar sobre o planejamento a ser adotado pela empresa. “Às vezes, temos divergências de interpretação entre o fisco e a legislação, abrindo margem para estratégias que, embora legais, possam ser discutidas administrativa ou judicialmente”, afirma o advogado tributarista Cláudio Henrique Resende Batista, sócio da DMGSA - Domingues Sociedade de Advogados.
Batista cita que esta fase inicial pode levar ainda a uma reclassificação de operações, que, na prática, pode transformar um arrendamento rural em uma parceria agrícola, reduzindo a tributação significativamente para empresas do setor agropecuário, por exemplo.
Eficiência e benefícios fiscais
Mesmo as despesas da empresa não fogem do planejamento tributário. Algumas podem ser deduzidas do imposto de renda ou contribuições sociais, por exemplo, reduzindo o lucro tributável e, por consequência, os impostos. Para maximizar essas deduções, é necessário haver um controle eficaz dos custos.
Alguns setores estratégicos podem ter acesso a diversos incentivos fiscais por parte de governos, reduzindo sua carga tributária. Esses benefícios podem ser oferecidos na forma de isenção, redução, compensação ou diferimento de impostos.
Entre os exemplos, há o ICMS Ecológico, oferecido por alguns estados brasileiros a empresas que atuam na preservação do meio ambiente com a adoção de práticas sustentáveis, como o uso de energia limpa.
Não só uma característica da empresa pode levá-la a alcançar o benefício, como também seu ramo de atividade. Setores específicos, como de tecnologia, inovação, exportação e sustentabilidade estão na lista de operações consideradas prioritárias.
Reorganização societária
Outra forma de reestruturação comumente usada como ferramenta de planejamento tributário é a reorganização societária. Empresas que passam por esse processo podem otimizar sua estrutura e reduzir a incidência de impostos.
Essa reestruturação pode se dar de várias maneiras, como com a criação de uma estrutura offshore ou de uma holding, como estratégia para aumentar a eficiência fiscal. Outras jurisdições podem apresentar regimes fiscais favoráveis a empresas estrangeiras, que, por sua vez, podem se beneficiar de isenções ou reduções de tributos e, ao mesmo tempo, proteger seus ativos e otimizar a gestão de riqueza.
Segundo Batista, “a reestruturação também pode envolver a constituição de novas empresas no grupo ou a reorganização das operações de maneira a reduzir o pagamento de tributos, como o IOF, que pode ser significativo em casos de empréstimos entre empresas do mesmo grupo.”
Essa reorganização facilita ainda o planejamento sucessório, evitando o pagamento de impostos desnecessários em caso de transferência de patrimônio.
Planejamento pré-migratório
Batista comenta que tem verificado uma consulta mais frequente de empresas brasileiras que buscam a mudança para o exterior , fundadas especialmente pelas novas políticas fiscais e econômicas não favoráveis. Esse tipo de movimento deve ser cuidadoso, mas mudar ou criar laços em outros lugares continua sendo uma estratégia que pode gerar resultados positivos em termos tributários.
Para tanto, como destaca o especialista, é importante contar com um bom planejamento pré-migratório, que basicamente é uma análise detalhada das implicações fiscais, patrimoniais, jurídicas e pessoais da mudança. O objetivo é garantir que a migração ocorra de maneira eficiente e vantajosa, do ponto de vista tributário e financeiro.
Um dos principais passos do planejamento pré-migratório é determinar a residência fiscal da empresa. Em geral, os países possuem diferentes critérios para definir onde os impostos devem ser pagos. É crucial entender as regras dos locais de origem e destino para evitar dupla tributação ou pagamento indevido ao fisco.
“A primeira regra tributária é a da territorialidade, ou seja, você deve pagar imposto no local onde a riqueza foi gerada. No entanto, se você se tornar um residente fiscal de outro país, como dos Estados Unidos, o país de residência irá tributar sua renda global, o que é chamado de universalidade. Nesse caso, você precisará declarar no exterior a renda obtida no Brasil, que muitas vezes já foi tributada, podendo ocorrer dupla tributação. Em relação aos Estados Unidos é possível compensar, eliminando o efeito da dupla tributação, mas em muitos outros países isso não será possível.”, aponta Batista.
Nereu Domingues, sócio fundador do DMGSA, destaca que “a economia tributária lícita, seja no Brasil ou no exterior, deve ser sempre consequência e nunca a razão de uma operação. É preciso que a operação pretendida tenha antes de tudo uma fundamentação econômica, uma razão de ser que não tenha origem em simples ganho tributário.”