Atualmente, mais de 5,5 milhões de processos trabalhistas estão em tramitação na Justiça do Trabalho no Brasil, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O número assusta, mas também mostra que muitas empresas ainda ignoram a importância de práticas de compliance trabalhista para mitigar riscos legais e promover um ambiente de trabalho justo e seguro.
Para o advogado Carlos Henrique Piacentini, especialista em direito empresarial da Vanzin & Penteado Advogados, o alto volume de litígios trabalhistas no país evidencia a negligência às leis trabalhistas vigentes e a falta de uma estrutura sólida para garantir a segurança jurídica no ambiente corporativo.
O advogado explica que a compliance trabalhista envolve a adoção de práticas e políticas internas para garantir a conformidade legal e dar suporte aos gestores e colaboradores da organização. Essa medida visa fomentar uma cultura corporativa ética e transparente, prevenindo conflitos e promovendo um ambiente de trabalho saudável e produtivo. “Além de reduzir a exposição a litígios, é uma forma de proteger a reputação empresarial”, comenta.
Segundo o CNJ, boa parte dos processos protocolados na Justiça do Trabalho no ano passado envolve assuntos referentes ao descumprimento das exigências legais, como verbas rescisórias, adicional de insalubridade, horas extras e intervalos, por exemplo.
Com a publicação da Lei da Igualdade Salarial (Lei 14.611/23), em julho de 2023, vem se intensificando a fiscalização sobre a igualdade de remuneração entre homens e mulheres, resultando em um aumento significativo nas autuações por práticas discriminatórias. Enquanto em outubro foram registradas apenas três autuações, em dezembro este número chegou a 40. “São questões que refletem a necessidade de uma gestão eficiente e transparente das relações de trabalho nas organizações”, analisa.
Contratos
O primeiro passo para estruturar a compliance trabalhista em uma empresa é a redação de contratos de trabalho. “Contratos bem elaborados são a base para um relacionamento transparente e seguro entre empregadores e empregados. Eles devem ser revisados regularmente para garantir que estejam atualizados conforme as leis trabalhistas vigentes, minimizando riscos de prejuízos financeiros e ações judiciais”, ressalta o advogado.
Segundo Piacentini, os contratos precisam especificar, de forma clara e precisa, as responsabilidades, direitos e deveres mútuos, bem como condições de trabalho, remuneração, benefícios e políticas internas. “Isso demonstra o compromisso da empresa com a legalidade e a transparência, reforçando a confiança dos colaboradores na organização”.
Outro ponto estratégico para a boa relação entre empregado e empregador é desenvolver políticas internas claras. Piacentini salienta que a criação de códigos de conduta e políticas internas bem definidas orientam o comportamento dos funcionários e terceiros, estabelecendo diretrizes que devem ser seguidas por todos.
“Isso ajuda a alinhar as expectativas e garantir que todos os membros da organização compreendam suas responsabilidades e os padrões de conduta esperados”, explica o advogado. Ele ainda salienta que são diretrizes que abrangem diversas áreas, incluindo comportamento no local de trabalho, ética profissional, práticas de inclusão e diversidade, entre outras normas de conduta.
Questões que envolvem o controle de jornada no regime de trabalho à distância e híbrido também costumam ser desafiadoras para as empresas. O advogado afirma que o uso de soluções tecnológicas adequadas é essencial para garantir o cumprimento da jornada e a segurança de ambos.
Ferramentas como sistemas de registro de ponto digital, softwares de gerenciamento de tempo e plataformas de colaboração são algumas das alternativas adotadas para monitorar as horas trabalhadas de maneira eficiente e precisa. “É importante que as políticas de trabalho remoto e híbrido sejam claras e comunicadas eficazmente a todos os colaboradores”.
Terceirização
A contratação de terceiros é uma prática cada vez mais frequente e permite que as empresas se concentrem em suas atividades principais enquanto terceirizam funções específicas. Piacentini ressalta, no entanto, que esse tipo de contrato precisa estar conforme a Lei da Terceirização (Lei 13.429/17) para garantir que os serviços não configurem vínculo empregatício. “É fundamental que as empresas assegurem que os contratos de terceirização sejam bem elaborados e as atividades terceirizadas estejam claramente definidas para evitar interpretações equivocadas que levem a reclamações trabalhistas”, pondera.
Ele observa ainda que a empresa contratante deve monitorar e garantir que a terceirizada cumpra todas as obrigações trabalhistas e previdenciárias para evitar possíveis passivos jurídicos e financeiros decorrentes de irregularidades. Isso inclui a verificação do pagamento de salários, concessão de benefícios, recolhimento de contribuições previdenciárias e cumprimento das normas de segurança e saúde no trabalho. A falta de controle e supervisão adequada pode resultar em responsabilidades compartilhadas e ações trabalhistas contra a empresa contratante.
Cultura organizacional
A gestão de afastamentos de colaboradores por acidente ou doença é um processo que exige atenção e rigor por parte das empresas. Procedimentos claros e a comunicação obrigatória ao INSS são fundamentais para garantir o cumprimento das obrigações legais e proteger tanto os direitos dos funcionários quanto os interesses da empresa. “A negligência nesse aspecto pode resultar em penalidades legais e complicações financeiras”, afirma.
Além disso, a condução de investigações internas e a gestão de disputas trabalhistas são essenciais para manter um ambiente de trabalho saudável e evitar litígios. O advogado adverte que estabelecer canais de denúncia confidenciais permite que os funcionários reportem irregularidades sem medo de retaliação, enquanto procedimentos eficientes para a resolução interna de conflitos ajudam a prevenir que as queixas trabalhistas escalem para o judiciário.
“Essas práticas não só fortalecem a conformidade legal da empresa, mas também promovem uma cultura organizacional transparente e ética. Ao investir em políticas robustas de gestão de afastamentos e resolução de disputas, as empresas garantem a proteção de seus colaboradores e a sustentabilidade de seus negócios”, pontua.