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Primeiro dia

“Ditadura sanguinária”: como a TV do PT transmitiu o julgamento de Bolsonaro 

Senador Humberto Costa e deputado Jilmar Tatto participam de transmissão de julgamento de Bolsonaro na TV PT.
Senador Humberto Costa e deputado Jilmar Tatto participam de transmissão de julgamento de Bolsonaro na TV PT. (Foto: Reprodução/YouTube)

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Esta terça-feira (25) foi um dia especial para o Partido dos Trabalhadores. O julgamento da denúncia contra Jair Bolsonaro e outros sete acusados de arquitetar um golpe de Estado teve transmissão ao vivo pela TV PT.

"Bom dia pra todo mundo que acompanha a TV PT. Hoje é terça-feira, 25 de março de 2025, um dia bastante aguardado pelos brasileiros. Dia que se inicia, então, o julgamento do chamado núcleo central, que vai determinar se Bolsonaro e outros sete envolvidos se tornam réus por tentativa de golpe de Estado”, saudou o apresentador Mateus (o sobrenome não aparece em momento algum). 

O áudio é ruim, mas é possível notar que o apresentador tem a voz excessivamente empostada. Ele usa calça skinny e tênis brancos sem meia aparente.  

O cenário emula as emissoras de notícias em canais da TV a cabo. A mesa de centro tem canecas do PT, livros e um globo terrestre em que o oceano é preto e os continentes são cinza. 

Secretário Nacional de Comunicação do PT, o deputado federal Jilmar Tatto foi convidado para um bate-papo de abertura. Ele explica que a transmissão é resultado de uma preparação cuidadosa da TV PT, que está sob seu comando na estrutura do partido. 

Na hora marcada para o início do julgamento, havia 4 mil pessoas assistindo à transmissão ao vivo. Quando o julgamento começou, com 20 minutos de atraso, eram 7 mil. 

No estúdio, Mateus é acompanhado pelo repórter André Rosa. Menos simpático e mais nervoso que o colega, ele enfrenta problemas de microfone.  

Direto do STF, uma repórter de cabelos vermelhos dá notícias sobre a movimentação de autoridades e o esquema de segurança. 

Tatto quer 43 anos de prisão para Bolsonaro 

Jilmar Tatto, sexto lugar nas eleições para a prefeitura de são Paulo em 2020, é o primeiro convidado do dia. Ele quer dar uma lição de História.  

“O que tem de importante para a História — e eu, como historiador, não poderia deixar de citar este caso — é que nós tivemos uma ditadura no Brasil que durou 21 anos, a ditadura militar. E nunca um general se tornou réu”. “Isso deixou uma ferida aberta”, afirma ele, que parece estar criticando a Lei da Anistia. 

Jilmar Tatto, que já foi investigado por corrupção quando comandou a Secretaria de Transportes da cidade de São Paulo, quer a pena máxima para Bolsonaro e os outros denunciados: “Seria o ideal, 43 anos na cadeia, para aprender, inclusive para as próximas gerações não se comportarem desta maneira”, ele diz. 

O Secretário de Comunicação do PT nunca foi dos melhores oradores do partido. Por vezes, ele derrapa na gramática. "O Bolsonaro vai ser preso, vai para a cadeia, e o grande debate que nós precisamos fazer... eu espero que os nossos jornalistas aqui da TV PT tenta (sic) descobrir qual que é o pensamento dos ministros da Primeira Turma... qual cadeia que ele vai: se ele vai ficar aqui em Brasília, se ele vai para o Tremembé em São Paulo, se ele via para o Bangu no Rio de Janeiro”, provoca. 

Antes de deixar o estúdio, Tatto também defende a regulação das big techs para conter a “propagação de notícias falsas”. 

Jurista corta o entusiasmo 

Quando a transmissão do julgamento se torna sonolenta, ela é interrompida para uma entrevista com o professor de Direito Pedro Serrano. Ele elogia a denúncia, que define como “tecnicamente perfeita”, e não tem dúvidas de que a tentativa de golpe de Estado está evidente. 

"Começar a empreender uma tentativa de matar o presidente da República, o vice e o ministro Alexandre, isso está demonstrado por prova científica", Serrano diz. Mas o jurista também afirma que é “ultra-importante” respeitar os direitos fundamentais dos réus. 

Ele corta o entusiasmo do apresentador André Rosa, que destaca que o 25 de março é o Dia da Constituição. "Hoje é o dia da Constituição brasileira. Qual a importância, na sua avaliação desse dia tão representativo para nossa história, para política, para a democracia, para o país, deste julgamento estar começando exatamente no dia de hoje?". 

Serrano pede calma. “Eu francamente acho que a as coisas têm que ser tratadas agora com extrema calma, sem muita intensidade. É preciso respeitar o devido processo legal. Esta é a mensagem da Constituição”, ele diz. 

Áudio vazado 

Enquanto o advogado José Luís Almeida Lima fala e a TV PT mostra imagens do julgamento, o som do estúdio continua audível por alguns segundos.  

É possível ouvir André Rosa fazendo comentários sobre as câmeras. “Tem hora que eu me perco mesmo”. Depois, como quem busca confirmação, ele afirma: “Essa é a número 1. A 1 é a que tem o TP [teleprompter]”. 

O colega explica como olhar para câmera certa. 

Antes do som ser cortado, André faz outro comentário: “Gostou dessa foto? Isso é um print que eu fiz”. Não é possível entender o contexto da conversa. 

A repórter do cabelo vermelho volta e afirma que o advogado Sebastião Coelho, que representa Filipe Martins, foi barrado no STF porque não havia feito o cadastro para entrar. 

“Está acontecendo um movimento agressivo de alguns bolsonaristas tentando burlar as regras e invadir as votações do Supremo Tribunal Federal”, ela diz. A repórter se confunde e dá a entender, que Coelho morreu: “Mesmo com todo o policiamento, ainda acontecem algumas fatalidades, como foi o caso dessa do Sebastião Coelho”. 

Humberto Costa quer o rigor da lei 

O presidente do PT, o senador Humberto Costa (PE), também participou da transmissão. Ele foi ao estúdio durante uma espécie de “show do intervalo” entre as sessões da manhã e da tarde. 

Costa acredita que a investigação feita pela Polícia Federal é de “altíssima qualidade”. Ele diz que os réus queriam não só dar um golpe de Estado, mas implementar uma “ditadura sanguinária” no Brasil.  

De volta ao estúdio, Jilmar Tatto diz que o julgamento “enfraquece” a pauta da anistia. “Ele se tornando réu, a população começa a perceber que o comportamento deles foi inaceitável”, afirma. “Se nós tivéssemos feito esse julgamento, o julgamento daqueles que fizeram a ditadura no Brasil — dos responsáveis, dos militares, dos generais — com certeza essa avenida não estaria aberta”, diz.  

Tatto acha que a democracia no Brasil vai bem. “O ambiente hoje é de muita normalidade, as instituições estão funcionando, o Bolsonaro vai ser preso e corja dele também”, assegura. Ele é não tem dúvida: “Aqueles que não aceitam o Estado democrático de direita têm que ir para a cadeia”. 

Já o senador Humberto Costa não tem pena de Débora Rodrigues, condenada a 14 anos de prisão após ter escrito “Perdeu, Mané” na estátua da Justiça, em frente ao STF. 

“Se ela tivesse ido para o STF para pichar uma estátua, enfim, poderia até se pensar que seria um crime de uma violência menor. Mas na verdade o que ela estava fazendo ali era se incorporando a um movimento golpista que pretendia atentar contra o Estado de direito”. Mais: “Ela foi co-participante de um processo que levou à destruição das sedes dos três poderes e tinha como objetivo principal instalar no Brasil uma ditadura”. 

Esta “ditadura sanguinária”, diz Costa, mataria o presidente da República e um ministro do Supremo Tribunal Federal. 

Nome errado e fake news 

Aparentemente é difícil fazer TV de qualidade apenas com as verbas do fundo partidário. Além de falhas técnicas, a transmissão tem gafes. André Rosa chamou uma professora e cientista política — entrevistada via Zoom — de "Gisele Citadando".  "Meu nome é Gisele Cittadino", ela corrigiu. 

A professora está contente sobretudo pela possibilidade de prisão do general Braga Netto, já que os militares têm uma longa lista de crimes que remontam à “república oligárquica”. 

Gisele desmente a tese de que apenas “velhinhos” participaram do ato. Ela traz dados: “Só 20% dos manifestantes daquele dia tinham mais de 60 anos — não que eu ache que alguém com mais de 60 anos possa ser velhinho”. 

“Essa moça do batom”, diz ela, “está completamente envolvida em todos os processos do golpe de estado. Ela é uma das figuras mais determinantes lá na frente do quartel em Brasília”, ela afirma. Depois, emenda uma inverdade: a de que Débora recebeu uma oferta de pagar uma multa e ficar longe das redes sociais por dois anos em um acordo de não-prossecução penal.  

“Ela se recusou a assinar. Ela podia estar em casa cuidando das crianças”, diz a professora, que leciona na PUC do Rio de Janeiro. 

O julgamento do STF e a transmissão do PT serão retomados nesta quarta (26). 

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