Mesmo que não tenha conseguido concretizar seu sonho de obter do Congresso Nacional uma licença para gastar sem limites, o governo Lula não pode reclamar do arcabouço fiscal aprovado pela Câmara dos Deputados na última quarta-feira (24) e que agora segue para o Senado Federal. Com um placar folgado, o texto substitutivo apresentado pelo relator, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), foi aprovado com 372 votos favoráveis, 108 contrários e 1 abstenção e traz algumas mudanças importantes em relação ao texto original encaminhado pelo governo, mas é brando em relações a punições e deixa a porta aberta para o aumento dos gastos públicos, bem alinhado ao propósito petista de inchar ao máximo a máquina pública.
Um dos principais pontos defendidos pelo governo foi mantido e a nova regra aprovada prevê que as despesas públicas vão aumentar ano a ano, ao menos 0,6%, com base na variação da receita. Esse “piso de gastos” vai garantir uma elevação real (acima da inflação) da despesa governamental, independentemente do estado da economia, e poderá chegar até a 2,5%, conforme as receitas do governo. Outro ponto mantido foi a blindagem do aumento do salário mínimo e os gastos com o programa Bolsa Família, que vão poder ficar fora desses limites. Por outro lado, o substitutivo removeu um item perigoso, que tentava sepultar de vez a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Certamente o arcabouço fiscal aprovado não é o ideal; há ainda muitas lacunas a serem preenchidas e a pressa na aprovação do projeto em nada ajudou a resolvê-las.
Pela proposta original do governo, não haveria punições no caso de descumprimento das metas fiscais: se a União gastasse demais ou arrecadasse de menos, bastaria justificar o não cumprimento das metas e apresentar propostas de correção. Seria uma carta branca para que Lula e seu governo pudessem gastar além da conta, inclusive além do próprio limite estabelecido pelo arcabouço fiscal. Esse descalabro, que escancararia de vez as portas para uma gestão fiscal irresponsável, foi retirado, com a incorporação de algumas leves sanções.
Segundo o substitutivo aprovado, se o governo não cumprir a meta de resultado primário em um exercício, no ano seguinte terá de adotar sete medidas de contenção de despesas, sendo proibido, por exemplo, de criar novos cargos, emprego ou função; alterar estrutura de carreira com aumento de despesa; criar despesa obrigatória; conceder ou ampliar incentivo tributário ou criar linhas de financiamento que possam aumentar as despesas públicas. Se as metas forem descumpridas por dois anos consecutivos, também será fica proibido conceder reajustes de salário a servidores, fazer novas contratações ou concursos públicos.
Quanto ao crime de responsabilidade por descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal propriamente dito, o texto especifica que ele ocorrerá apenas se não forem adotadas as medidas de contingenciamento e for ordenado o aumento de despesas infringindo as vedações impostas ou ultrapassado os limites de crescimento real da despesa. É um freio bem tênue à gastança, ainda mais considerando a falta de uma convicção autêntica do governo lulista sobre a importância da responsabilidade fiscal.
Outro ponto que causou chiadeira e reclamações entre os partidos de esquerda foi a manutenção dentro da regra fiscal do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e dos recursos destinados ao pagamento do piso de enfermagem. O governo queria que os dois itens fossem mais duas “exceções” à regra, mas não conseguiu e agora vai ter de mantê-los no cálculo todas das despesas.
Certamente o arcabouço fiscal aprovado não é o ideal; há ainda muitas lacunas a serem preenchidas e a pressa na aprovação do projeto, que não passou pelas comissões da Câmara por tramitar em regime de urgência, em nada ajudou a resolvê-las. Ainda assim, é melhor do se não houvesse freio algum à sanha gastadora de Lula, que, com dissemos em outras ocasiões, parece sofrer de um caso grave de terraplanismo econômico, ao acreditar que os gastos públicos podem ser ampliados indefinidamente sem consequências.
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