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licenciamento ambiental é afetado por paralisação de servidores
Paralisação de servidores afeta emissões de licenciamento ambiental. Há quatro meses, atuação em campo se limita a emergências.| Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Pelo menos 40 grandes empreendimentos em todo o país estão sendo afetados pela paralisação de servidores ambientais do governo federal que já dura quatro meses. Sem realizar as chamadas atividades de campo, os servidores se limitam aos trabalhados nos escritórios, o que afeta as vistorias que precisam ser feitas nos locais dos empreendimentos para emissão do licenciamento ambiental.

A lista de empreendimentos parados, que envolve projetos de geração de energia, transmissão, petróleo, prospecção dos poços e perfuração, foi divulgada pela Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema).

Além dos atrasos na emissão de licenças ambientais, a paralisação também tem potencial de afetar a imagem internacional do governo, que vem fazendo propaganda da 30ª Conferência sobre Mudanças Climáticas (COP-30), que será realizada em Belém-PA, em novembro de 2025. O impacto se deve ao fato de que a paralisação tem efeitos na prevenção e no combate às queimadas, além de ações de fiscalização e combate ao desmatamento.

A mobilização dos servidores iniciou em outubro do ano passado, quando uma proposta de reestruturação da carreira ambiental foi apresentada ao governo federal. Sem avanços significativos, em janeiro deste ano, os servidores de carreira do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), que inclui o Serviço Florestal Brasileiro, e de suas vinculadas, Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), iniciaram uma paralisação que está entrando no quinto mês. Os servidores querem garantir o atendimento a uma série de demandas, que envolvem gratificações e alteração em tabelas salariais, e vão além do aumento do salário proposto pelo governo.

Emissão de licenças tem menor índice dos últimos 14 anos, diz associação

Todo empreendimento, potencialmente poluidor, precisa de Licença Ambiental para funcionamento. Isso vale tanto para empreendimentos de pequeno porte até as grandes indústrias, mas a competência para condução do processo varia. Ao Ibama compete a responsabilidade de emitir licença especialmente para grandes projetos de infraestrutura que envolvam impactos em mais de um estado e nas atividades do setor de petróleo e gás na plataforma continental.

Nos primeiros três meses de paralisação dos servidores ambientais, somente 41 licenças ambientais foram emitidas pelo Ibama. O número representa uma queda de 91% na comparação com o mesmo período do ano passado, quando foram emitidas 476 licenças. Os dados são da Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema). Eles também afirmam que este é o menor número de licenças emitidas desde ao menos 2010.

Ainda de acordo com a associação, até mesmo obras do governo federal foram impactadas. Em se tratando de obras incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), houve uma diminuição de 68 licenças e autorizações emitidas no primeiro trimestre de 2023 para apenas 11 no mesmo período de 2024.

Atualmente, pelo menos 40 grandes empreendimentos relacionados à projetos de energia e petróleo também estão com licenciamentos paralisados. Confira a lista abaixo.

Transmissão de energia

  • 13 processos de linhas de transmissão aguardando emissão de Licenças Prévia, Instalação e Operação;
  • 3 processos em análise de requerimentos de licenças para gasodutos.

Petróleo 

  • Licenças de instalação do IPB;
  • Licença prévia do BM-C-33;
  • Licenças de instalação de Búzios 6 e Búzios 8.

Prospecção dos poços 

  • Petrobras – Pesquisa Sísmica – Barracuda e Caratinga, Bacia de Campos – Parecer de Licenças Prévias 
  • Petrobras – Pesquisa Sísmica – Cluster Bacia de Campos ÁguasProfundas – Parecer de Licenças Prévias 
  • CGG – Pesquisa Sísmica – Projeto Megabar Extensão – Agendamento de RTI 
  • Spectrum – Pesquisa Sísmica – Potiguar 3D Phase 2 – Enquadramento e emissão de TR 

Perfuração 

  • Petrobras – Perfuração – FZA-M-59 – Parecer do recurso de negativa 
  • PetroRio – Perfuração – Wahoo – Parecer do EAP Rev 00 
  • BP – Perfuração – Pau-Brasil -Parecer do EAP Rev.00 
  • Perenco – Polo Pargo – Parecer de anuência para atividades de canhoneio 
  • BW – Perfuração – Campo de Golfinho – Enquadramento e emissão de TR 

Mineração 

  • Consórcio Santa Quitéria – Projeto Santa Quitéria – está na fase de checklist (análise interrompida) 
  • Vale S.A. – Complexo Serra Norte de Carajás – ampliação da mina N5 (depende de emissão de Autorização para Captura, Coleta e Transporte de Material Biológico ) 
  • Vale S.A. – Projeto de Reprocessamento de Rejeito da Barragem do Gelado 
  • Rio Grande Mineração S.A. – Projeto Retiro – vistoria suspensa. 

Geração de energia 

  • 4 processos de termelétricas que somam 5.970,7 MW de capacidade 
  • 3 eólicas que somam 934,8 MW 

Ainda em março, o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) informou que em três meses de paralisação do Ibama o setor havia deixado de faturar R$ 3,4 bilhões e que R$ 650 milhões por mês deixaram de ser investidos pelos atrasos nos licenciamentos.

"É importante compreender o papel crítico e estratégico do Ibama para a competitividade do país na atração de investimentos, especialmente externos. A mobilização vem causando um enorme impacto no setor e coloca em risco o desenvolvimento socioeconômico brasileiro, e a forte arrecadação de tributos, fundamentais para a sociedade", diz a nota do IBP, que também cita impactos negativos na arrecadação de tributos e geração de empregos no setor.

Pressão de servidores ambientais pode atrapalhar planos do governo Lula para COP-30 

Além da promessa de valorização dos servidores, a questão ambiental é cara ao governo, que vê na pauta uma possibilidade de projeção internacional. A pressão política dos servidores ambientais, em especial, recai ainda sobre a 30ª Conferência sobre Mudanças Climáticas (COP-30), que será realizada em Belém, no Pará, em novembro de 2025.

Neste contexto, a apresentação de números positivos relacionados às queimadas e ao desmatamento seria um trunfo para o governo Lula. No entanto, de acordo com o presidente da associação de servidores ambientais, Cleberson Zavaski, sem as ações de prevenção e combate a queimadas e fiscalização de desmatamento, o governo pode ver os índices piorarem.

Para o analista político e ex-diretor do Ibama, Samuel Souza, os servidores apostam especialmente na pressão política para conquistar avanços na negociação. “A pressão é ainda maior porque o governo apostou alto nos dados do desmatamento para conquistar projeção internacional”, avalia Souza.

Após o início da paralisação dos servidores ambientais, os números de queimadas vêm subindo e batendo recordes. No que diz respeito ao desmatamento, o governo Lula terá o primeiro índice baseado somente nos dados do atual mandato a partir de julho. Após anunciar queda de até 50% no desmatamento, na comparação entre o segundo semestre de 2022 e o primeiro semestre de 2023, o feito pode não se repetir.

O motivo é que a fiscalização do Ibama está paralisada e deve impactar os números. Os dados da associação de servidores apontam, por exemplo, que os autos de infração relacionados ao desmatamento na Amazônia Legal tiveram uma diminuição de cerca de 87%, saindo de 1.513 no primeiro trimestre de 2023 para apenas 184 mesmo período de 2024. Em todo o Brasil, a emissão de autos de infração pelo Ibama reduziu 67%, de 4.689 no primeiro trimestre de 2023 para 1.517 em 2024.

“Nós demos o nosso sangue em 2023 para retomar as ações ambientais no Brasil. Mas agora, estamos com as atividades de campo paradas desde o dia 2 de janeiro. Estamos atendendo apenas emergências de nível 3 [o mais alto]”, disse Zavaski.

Entre fevereiro e março, quando recordes de focos de queimadas foram registrados em Roraima, o governo alegou as ocorrências eram "agravadas pela estiagem prolongada, intensificada pela mudança do clima e por um dos El Niños mais fortes da história".

Mesmo com promessa de valorização, negociações não avançam 

A promessa de valorização dos servidores fez parte dos discursos de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A mobilização dos servidores, no entanto, demonstra a insatisfação com o governo.

Desde o início da mobilização dos servidores, já foram realizadas pelo menos quatro reuniões entre os representantes dos servidores e o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI). Na última reunião da Mesa Específica e Temporária de Negociação (4ª reunião), em 5 de abril, foram apresentadas novas tabelas de reajustes salariais para os próximos dois anos.

Dentre os principais pontos da proposta, estão uma oferta de reajuste médio de 35% no vencimento básico; um reajuste no valor da gratificação por qualificação e a criação de uma gratificação de localização para beneficiar servidores lotados em locais de média e alta dificuldade de atuação.

A proposta, no entanto, não agradou os servidores e foi rejeitada pelas assembleias estaduais. Com isso, a associação que representa os servidores ambientais passou a estudar um contraproposta que deve ser apresentada ao MGI nos próximos dias.

“Para quem vai entrar na carreira, a tabela remuneratória de nível superior é pior do que a atual nos primeiros 15 anos, tornando área ainda menos atrativa, colocando em risco o futuro da gestão ambiental no país”, afirmou a associação ao comentar a última proposta apresentada pelo governo.

A Ascema aponta ainda que há um déficit de 4 mil vagas no número de servidores. “Cerca de 45% dos cargos estão vagos, estamos à beira de um colapso, sem servidores ambientais no Brasil”, disse o presidente da associação, Cleberson Zavaski, em uma transmissão feita pelo YouTube.

Em nota, o Ministério do Meio Ambiente sinalizou a formalização de pedidos de novos concursos públicos para o Ibama, o ICMBio e o Jardim Botânico do Rio de Janeiro, com o objetivo de preencher cerca de 3,3 mil vagas.

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