Circulando pelas ruas da Vila União e por outras vilas do entorno, no fim da tarde de ontem, era possível perceber o clima de expectativa entre os moradores. Os boatos afirmavam que havia toque de recolher novamente, e que era necessário estar em casa antes das 18 horas para não correr riscos. Trinta minutos antes do prazo, mães buscavam filhos nas escolas; crianças ultrapassavam a linha do trem olhando amedrontadas para trás; trabalhadores apressavam o passo para chegar mais rápido em casa. Uma senhora rezava o terço à espera do filho que estava atrasado.
Uma moradora da Vila Solitude, dentro do Bolsão Audi-União, buscou os filhos mais cedo na escola. Ela tem de atravessar a linha do trem a pé com os três filhos e não quer correr riscos. Na tarde de segunda, ela presenciou professoras e crianças chorando. A sua filha de oito anos chegou a passar mal e vomitou durante toda a noite, de tão nervosa. "Nem vou mais na igreja desde domingo".
Em outra escola, a comoção era a mesma. Mães se amontoavam em grupos à espera do sinal. Uma delas dizia que filhos de envolvidos com o tráfico estudam no local. Conversas sobre drogas e armas são comuns, segundo ela. "Eu é que tento preservar meu filho e aviso que não deve se misturar".
Na turma de Jéssica (nome fictício), 10 anos, somente 14 dos 33 alunos compareceram. "Não vou trazer minha filha nos próximos dias e pretendo tirá-la da escola", desabafa a mãe. Ela dizia ter visto um homem encapuzado em uma moto avisando do toque de recolher. "Se é verdade ou não, não sei. Mas temos de obedecer".
Uma professora de uma das cinco escolas da região diz que não volta a trabalhar tão cedo. "Das pessoas que moram no Bolsão, 95% são pessoas de bem, trabalhadoras. Não mereciam estar passando por isso". A vida de muitos de seus alunos, segundo ela, é afetada pelo tráfico. Moram em casas transformadas em bocas de fumo e não conseguem dormir à noite. Armamentos também são comuns na vila. "Crianças de 9, 10 anos já sabem o que é uma pistola calibre 9 milímetros", diz um policial. (AP)
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