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“Quis custodiet ipsos custodes?”
Juvenal, poeta romano (c.55-c.127)
No trono da Justiça sentou-se um rei,
de toga e verbo reluzente.
Prometendo luz, teceu o enredo
de um tempo escuro e decadente.
“Democracia!”, gritava ao vento,
mas calava quem pensava diferente.
Nas praças e nas redes, a liberdade
cedeu lugar ao prudente medo.
A pena do rei virou espada, enquanto
a Constituição era rasgada.
Opinião virou delito; pensar,
um verbo suspeito e aflito.
Mensagens somem, perfis se apagam,
ideias livres não se propagam.
Candidatos barrados, sonhos riscados,
urnas feridas, votos algemados.
A imprensa amiga, obediente e curvada,
invertebrada a tudo aplaude, entre o medo
e o mando. Editorial comprado, manchete
vendida, verdade traída. Até quando?
Alguns fogem, buscam abrigo:
o exílio vira pátria e castigo distante.
Outros são presos sem chance de defesa,
por crimes de fala, sem prova ou certeza.
(mas é tudo legal, o rei garante).
Os tempos são bons, proclamam os dados,
mas o povo conta centavos cansados.
O pão que falta mata a esperança,
enquanto ministros fabricam bonança.
A pobreza cresce, discreta e constante,
na vida real. Mas a elite brinda – fina,
elegante e sincera – à narrativa
de que tudo está normal.
E, no planalto central,
Sombras dançam, contentes
com a liberação das emendas
e a vitória da democracia relativa.
Supremos censores editam o passado,
mascaram o temor, fingem cuidado.
“Defendemos a ordem!” — afirmam
serenos e indiferentes, enquanto
acorrentam o pensamento pleno.
Quem pesa o peso de tanto poder?
Quem guarda o guardião, na sua autoridade?
Quem julga o juiz, em sua verdade cega?
Quem vigia o vigilante que a liberdade nega?
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