No início da tarde do dia 30 de dezembro de 1974, o estudante Anthony Barbaro, de 17 anos, entrou na escola secundária de Olean, no estado de Nova York (EUA), e acionou o alarme de incêndio. Os funcionários que correram para atender à suposta emergência foram recebidos a tiros pelo adolescente. Três morreram.
Trinta anos e quarenta ataques similares depois, os atentados contra escolas norte-americanas continuam a representar um quebra-cabeça em que falta uma peça. A forma de ataque, o perfil do agressor e o objetivo da ação formam um padrão recorrente, mas os motivos que levam um jovem a matar desconhecidos se perdem no momento em que, acuado, o perpetrador comete suicídio e sela o massacre.
Nos últimos três dias, a sociedade brasileira partilha a mesma busca por significado e prevenção, temendo que esse tipo de ação se torne um novo sintoma da crônica falta de segurança no país. Dependendo do narrador, a ação de Wellington Menezes de Oliveira autor do massacre na escola de Realengo, no Rio de Janeiro decorre da facilidade de acesso a armas, de deficiências no acompanhamento psicológico de crianças ou, ainda, da falta de porteiros adequadamente treinados em escolas públicas.
"É uma busca coerente. Todo episódio que nos impacta provoca perguntas sobre a natureza do fato. Indaga-se sobre o que a sociedade está fazendo com o ser humano, como o está influenciando", justifica a psicóloga Cleia Oliveira Cunha, especialista em Psicologia Social e Jurídica. "Pelo que temos percebido, esse é um fenômeno que dura mais ou menos uma semana. Não há educação para que a população seja crítica o suficiente para manter essas indagações", avalia.
Bullying
As poucas informações disponíveis sobre Wellington apontaram a hipótese de bullying. Um estudante tímido e solitário, constantemente provocado e agredido por colegas, volta para "dar o troco", ainda que indiretamente, já que os 12 estudantes mortos não eram contemporâneos do agressor.
A socióloga Miriam Abramovay, coordenadora da área de juventude da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), acredita que a tese é simplista demais para conseguir explicar a motivação do crime. "O bullying é um conceito muito incompleto, que a gente está usando sem saber direito o que é", opina.
Ela acredita que as motivações profundas de Wellington permanecerão ocultas. "A primeira questão a relevar é o fato de que se trata de um caso insólito, imprevisível. Nunca saberemos completamente a razão desse jovem de agir de tal maneira. O que está aparecendo são características de uma pessoa esquizofrênica e retraída. Mas, nessas horas, alguns estereótipos tendem a ser construídos", alerta.
Columbine
Nos Estados Unidos, o massacre na escola secundária de Columbine, no estado do Colorado, tornou-se referência para estudos sobre a relação entre convivência escolar e violência. Além da quantidade de mortos (12, o 4.º ataque mais letal dos EUA), o crime ocorrido em 1999 se sobressaiu também por ter sido uma ação conjunta de dois estudantes.
Três anos depois, o Departamento de Educação e o Serviço Secreto dos Estados Unidos divulgaram o relatório Safe School Initiative (Programa Escola Segura), destinado a ajudar educadores a identificar ameaças em suas instituições de ensino. Pesquisando o perfil de 41 autores de ataques a escolas, o estudo ajudou a derrubar alguns mitos do assassino em massa.
De acordo com o levantamento, quase dois terços (63%) raramente ou nunca tiveram problemas disciplinares. Porém, 71% se sentiram perseguidos pelos colegas, e mais da metade (61%) tinha um retrospecto documentado de depressão ou desespero. Quatro em cada cinco tentaram cometer suicídio.
Pesquisadora do caso de Columbine, Miriam percebe semelhanças entre esse caso e a tragédia carioca. "Havia um alvo selecionado. Os dois rapazes americanos até anunciaram na internet que iriam fazer aquilo. O que aprendemos em Columbine é que a escola deixou de ser um lugar de confiança dos alunos", analisa.
Ainda segundo o estudo norte-americano, em 81% dos casos havia outros estudantes que conheciam os planos do atirador. Em um caso paradigmático, relatado na pesquisa, o autor do atentado contou a dois colegas o que planejava fazer, e os aconselhou a permanecer no mezanino da escola, fora da linha de tiro. A notícia se espalhou, e no dia do ataque havia um total de 24 estudantes esperando o começo do ataque. Um deles portava uma câmera fotográfica.
Timidez clínica
Já os psicólogos norte-americanos Bernardo Carducci e Kristin Nethery, do Instituto de Pesquisa da Timidez, desenvolveram um conceito e o aplicaram aos mais recentes atiradores em escolas. A clinical shyness (timidez clínica) tem como sintomas apatia, baixa tolerância à frustração, ataques de raiva, rejeição social, relações familiares ruins e acesso a armamentos. Acometeria principalmente jovens do sexo masculino, e poderia levar a comportamento violento.
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Interatividade
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